Contaminação no Rio Pará por resíduos de refinadora norueguesa

No dia 28 de março, relatório técnico do Instituto Evandro Chagas (IEC), ligado ao Ministério da Saúde, atestou altas concentrações de metais pesados nos resíduos lançados sem tratamento pela empresa Hydro Alunorte no Rio Pará e afluentes. Após fortes chuvas em fevereiro, efluentes contendo material tóxico, denominados genericamente como lama vermelha, chegaram ao ambiente por meio de tubulação clandestina e por vazamentos em bacias de tratamento, afirma o IEC. A Hydro Alunorte contesta o relatório: em documento lançado no dia 9 de abril, a consultoria ambiental SGW Services, contratada pela empresa, nega vazamentos ou contaminação ambiental. Antes disso, no dia 3, o Governo do Pará, por meio de ação civil pública, pediu que a Justiça multe a empresa em 250 milhões de reais por crime ambiental.

Histórico

Em fevereiro, diversas comunidades na região de Barcarena, a 50km de Belém, ficaram inundadas após fortes chuvas. Denúncias de moradores sobre o aspecto avermelhado da água levaram técnicos do Ministério Público Estadual e Federal, além da Secretaria Estadual do Meio Ambiente e do Instituto Evandro Chagas, a sobrevoarem a região e coletarem amostras da água para análise. A suspeita era de que as bacias da Hydro Alunorte não haviam suportado o volume de água e espalharam material tóxico no meio ambiente.

A empresa é a maior refinadora do mundo de óxido de alumínio, também chamado de alumina, sendo responsável por 7%, ou 6,3 milhões de toneladas métricas anuais, do produto, que é a principal matéria-prima do alumínio primário usado na indústria. A Hydro Alunorte foi comprada em 2010 da mineradora Vale e pertence à Norsk Hydro, empresa listada na Bolsa de Valores de Oslo e cujo maior acionista, com 34,4% do capital, é o governo norueguês. Em 2009, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) já havia multado a subsidiária por vazamentos, mas a empresa recorreu e as multas, que somam 17,1 milhões de reais, nunca foram pagas.

Um primeiro laudo do Instituto Evandro Chagas, divulgado em 22 de fevereiro, confirmou o vazamento de lama vermelha, levando o Ministério Público do Pará a instaurar dois inquéritos e recomendar à empresa que suspendesse a operação de uma das duas bacias de resíduos, além de elaborar plano de contenção e mitigação de danos. A Norsk Hydro passou a distribuir água potável para a população local e afirmou que contribuiria para as investigações.

O novo laudo do IEC divulgado no final de março confirmou a contaminação. Foram encontradas, nos arredores do parque industrial da Hydro Alunorte, taxas acima do permitido em lei de mercúrio, arsênio, alumínio e urânio, substâncias encontradas nos rejeitos gerados no processo de obtenção da alumina. O tubo clandestino encontrado pelos técnicos foi, segundo a empresa, fechado.

No dia 2 de abril, a refinadora deu férias coletivas para 400 funcionários, justificados pela redução da produção em 50% acordada com o Ministério Público.

Contradições e contestações

O novo relatório do Instituto Evandro Chagas apresenta uma dimensão mais completa da contaminação. "As águas do Rio Murucupi, no trecho entre a comunidade Vila Nova e as nascentes, estão comprometidas com níveis de alumínio, ferro, arsênio, cobre, mercúrio e chumbo acima do que prevê a legislação brasileira", afirma o documento. "Logo, são águas que não devem ser usadas para consumo humano, recreação ou pesca, até que se façam estudos de eco toxicidade na região. Todos os elementos tóxicos encontrados nos efluentes da empresa Hydro também são encontrados nas águas do rio Murucupi". Em outro trecho do documento, os técnicos destacam que o volume de água do Rio Pará é muito grande, sendo necessárias grandes ou contínuas quantidades de resíduos tóxicos para alterar os parâmetros químicos locais.

Essas informações foram contestadas pelo relatório encomendado pela empresa e divulgado nesta segunda-feira. O documento, elaborado pela consultoria ambiental SGW Service, afirma não existir indicação de contaminação em rios, igarapés e lençóis freáticos em Barcarena. De acordo com a Hydro Alunorte, os dados são parciais, mas serviriam para contestar os resultados do relatório do Instituto Evandro Chagas.

"O relatório do IEC é abrangente, determinando todos os possíveis poluentes de acordo com a legislação e encontrando alguns em graus acima do permitido. A amostragem também é abrangente, englobando diferentes áreas com ocorrência de lama vermelha. Neste sentido, do ponto de vista de qualidade de análises químicas, é um relatório impecável e competente, expressando todos os resultados, métodos dos ensaios realizados, contendo inclusive resultados de análises realizadas com padrões de referência certificados, o que evidencia a competência do laboratório", afirma Maria Alice Ibañez Duarte, chefe da Divisão Técnica de Engenharia Química do Clube de Engenharia.

Maria Alice destaca, ainda, contradições entre o que a empresa divulga e suas reais práticas. Em seu site, a Hydro Alunorte afirma que não utiliza o sistema de armazenagem em lagos da lama vermelha, resultado do processo de produção da alumina. "A indústria do alumínio vem abandonando o método de armazenagem em lagos de lama vermelha em favor do empilhamento a seco, que é muito mais eficiente e também mais seguro para o meio ambiente. A Hydro adota somente o sistema de empilhamento a seco para armazenar os resíduos da bauxita", afirma. A informação vai de encontro, no entanto, ao relatado pelo Instituto Evandro Chagas, que encontrou tubulação clandestina na área industrial da empresa, pela qual lama vermelha era irregularmente jogada no ambiente. O resíduo químico também foi encontrado e analisado em trecho da rodovia PA-481, onde um caminhão transportador tombou, possivelmente contaminando igarapés próximos.

Recomendações

O Instituto Evandro Chagas, na conclusão do relatório técnico, apresentou três recomendações principais para que se minimizem os impactos ambientais dos vazamentos. São eles:

– Continuar a disponibilizar, pelo menos até o final do período de chuvas, água potável às comunidades do Bom Futuro, Jardim dos Cabanos, Burajuba e Vila Nova, pois as águas do rio Murucupi apresentam níveis de metais tóxicos que oferecem riscos à saúde humana a partir do consumo direto ou uso para recreação e pesca.

– Ampliar esta disponibilização de água potável no mesmo período para as comunidades que residem nos municípios de Barcarena e Abaetetuba às margens dos igarapés Dendê e Curuperê, e rios Pará, Arapiranga, Guajará do Beja, Arienga e Tauá. Como citado, com esses dados não foi possível confirmar alterações na qualidade das águas em outras áreas da região.

– As águas superficiais e de consumo humano no entorno do empreendimento da Hydro devem ser continuamente biomonitoradas, através de sistemas telemétricos e coletas in loco, e criado sistema de alerta as populações que moram ao redor ou fazem uso delas. Todo biomonitoramento na região deve conter dados completos com análises de metais como previsto na legislação brasileira.

Já a Hydro Alunorte, que nega a contaminação, afirma, nas conclusões do relatório apresentado pela SGW Services:

- Não houve transbordo das áreas de depósitos de resíduos de bauxita da Alunorte.

- Não há evidências de que a Alunorte contaminou as comunidades locais de Barcarena.

- Não há indícios de qualquer impacto ambiental significativo ou duradouro nos rios próximos.

- Propostas de melhoria nas seguintes áreas: capacidade de gestão e tratamento de água, upgrades e manutenção, planos de emergência e treinamento

Clique aqui para ler o relatório completo do Instituto Evandro Chagas.
Clique aqui para ler o relatório divulgado pela Hydro Alunorte/Norsk Hydro (em inglês).

 

 

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