Aterros sanitários poderiam ser menores - ou inexistentes - caso houvesse coleta seletiva. Foto: Gabriel Jabur / Agência Brasília

Uma relação sustentável, e mesmo lucrativa, com os resíduos produzidos pelas cidades. Essa é a experiência que o professor Adacto Benedicto Ottoni, professor do Departamento de Engenharia Ambiental da UERJ apresentou, em 05 de novembro, no Clube de Engenharia. A palestra “Gestão do Lixo Urbano do Rio de Janeiro e a Sustentabilidade Ambiental” foi organizada pela diretoria de Atividades Técnicas (DAT) e a divisão técnica de Engenharia do Ambiente (DEA).

Com o objetivo claro de mostrar que não só grandes prefeituras conseguem transformar resíduos em lucro, de forma responsável e sustentável, Adacto citou exemplos de pequenas cidades que, com vontade política, resolveram seus problemas com o lixo e, com viabilidade ecológica e econômica, beneficiando a população, transformaram, de forma sustentável, os resíduos em lucro.

A cidade de Miracema, no Estado do Rio de Janeiro, foi um dos casos apresentados por Adacto. “Aquela é uma prefeitura pequena, pobre, mas teve um prefeito que decidiu fazer uma gestão sustentável de fato. Como não havia dinheiro para construir um aterro sanitário, foi feito um convênio com a Fiocruz por meio do qual alunos implantaram e geriram todo o projeto. A prefeitura só precisou instalar a coleta seletiva na cidade”, conta Adacto. Lá, no local onde funcionava um lixão uma empresa assumiu, após licitação, e passou a vender o lixo reciclável e destinar a matéria orgânica para uma usina de compostagem. O chorume proveniente do lixo ainda não tratado passou a ser levado até uma área próxima para alimentar o solo de uma floresta de eucaliptos recém-plantada. “O composto orgânico gerado foi para minhocários e o que saía dali era distribuído depois para os agricultores da região”.

A parte seca do lixo, como vidro, plástico e papel era separada e vendida para gerar recursos, fechando o ciclo sustentável: a prefeitura não precisava pagar os catadores. O sistema gerava dinheiro por si só e se pagava em cooperativa. “Todo esse trabalho bem-sucedido aconteceu em uma cidade que gerava 12 toneladas de resíduos por dia. O Rio de Janeiro gera 10 mil toneladas por dia. É esse o tamanho do potencial econômico que jogamos fora”, lamenta Adacto, que destaca, inclusive, a importância do processo na reparação histórica. “Um canteiro de mudas foi criado e alimentado com o composto orgânico proveniente dos resíduos. As mudas foram doadas para a população local e para recuperar a bacia de Miracema, totalmente degrada desde a época das plantações de café no local. Aos poucos, graças a esse trabalho, a natureza está retornando e já há impactos positivos no turismo na cidade”, comemora o professor.

Visão de oportunidade
Políticas Públicas que podem resolver problemas e gerar renda nem sempre são vistas como o que são: oportunidades. No caso do lixo, isso não é raro. Nesse arranjo sustentável, tudo o que a prefeitura precisa fazer é instalar a coleta seletiva na cidade. Ainda assim, isso costuma ser visto como custo, não como investimento. “Todo o mercado da reciclagem é estimulado, gerando emprego e renda. Riscos de poluição por chorume, cujo custo é enorme, são suprimidos. Nada disso costuma ser pesado”, lamenta Adacto.

Na falta da implementação de um plano sério, sustentável, as prefeituras seguem enxugando gelo. É o caso do Rio de Janeiro, que tem um lixo oficial – aquele que a Conlurb tem acesso – e um lixo real, que desce das favelas nas enchentes. Segundo Adacto, a Conlurb faz o que pode na coleta do lixo da cidade, mas é insuficiente por falta de políticas públicas que resolvam os problemas das favelas. “A Conlurb é uma heroína. Ela faz o máximo. Mas as decisões políticas estão na contramão. Na favela de Rio das Pedras, que é uma favela plana, é a mesma coisa. O lixo fica lá, jogado dentro da comunidade. São questões que não são enfrentadas e resolvidas pela prefeitura. O resultado é um cotidiano de enchentes constantes, mesmo em uma prefeitura rica”, destaca.

Ao contrário de outras questões problemáticas para a população, que dependem de mudanças na legislação, a questão dos resíduos sólidos tem uma legislação eficiente que, infelizmente, não é colocada em prática. Adacto citou a Lei 12.305, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos. O texto institui não só os caminhos necessários, como o artigo 36, que determina que deve ser implantado um “sistema de compostagem para resíduos sólidos orgânicos e articular com os agentes econômicos e sociais formas de utilização do composto produzido”, mas também a ordem de prioridades a ser observada. O artigo 9 determina que “na gestão e gerenciamento de resíduos sólidos deve ser observada a seguinte ordem de prioridade: não geração, redução, reutilização, reciclagem, tratamento dos resíduos sólidos e disposição final ambientalmente adequada dos rejeitos”. Poucas dessas ações são realidade hoje e caso esse cenário não mude, as próximas gerações terão que lidar com enormes problemas. “Já está ficando difícil de viver no nosso planeta. As decisões políticas precisam acontecer agora para construir um futuro sustentável”, destaca Adacto.

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