Gestão integrada de municípios é estratégia para desenvolvimento da Baixada Fluminense

A Baixada Fluminense, região que concentra 13 municípios do estado do Rio de Janeiro, não raro é lembrada por seus problemas urbanos, principalmente os ligados a infraestrutura precária e índices socioeconômicos baixos. Em palestra no Clube de Engenharia, em 25 de abril, o conselheiro Luiz Edmundo da Costa Leite, ex-secretário de planejamento de Duque de Caixas, defendeu iniciativas de gestão integrada de municípios como estratégia para enfrentar esses problemas, historicamente ligados às dificuldades no desenvolvimento econômico da região. A visão é compartilhada por outros especialistas que participaram do evento, promovido pela Diretoria de Atividades Técnicas (DAT) e pela Divisão Técnica de Urbanismo e Planejamento Regional (DUR) do Clube de Engenharia.

"A região metropolitana do Rio de Janeiro é, de certa forma, um retrato do país, com muitas desigualdades", afirmou o palestrante, que também é ex-secretário municipal de obras do Rio. Dos 12 milhões de habitantes do chamado "Grande Rio", cerca de 3,7 milhões são moradores da Baixada Fluminense, formada pelos municípios de Belford Roxo, Nova Iguaçu, Queimados, Japeri, Paracambi, Itaguaí, Seropédica, Mesquita, Nilópolis, São João de Meriti, Duque de Caxias, Guapirimim e Magé. A região sofre com o índice crescente de violência, PIB per capita baixo e desabastecimento de água, entre outros problemas, que para Luiz Edmundo da Costa Leite são frutos de questões políticas. Ele citou o exemplo da gestão de impostos, que influencia diretamente a capacidade dos municípios investirem em melhorias: "A capacidade das prefeituras de recolher, controlar e fiscalizar impostos é muito pequena", afirmou o engenheiro, lembrando que, por vezes, os municípios dependem de emendas parlamentares para aumentar o orçamento, um tipo de recurso que, em tese, deveria ser secundário.

Luiz Edmundo da Costa Leite aponta que, apesar dos problemas em infraestrutura, a maior demanda local não é por asfalto, água ou iluminação pública, e sim por creches. "Por trás disso há uma questão social, principalmente para as mães de família. As mulheres da Baixada Fluminense precisam trabalhar, e trabalham na cidade do Rio de Janeiro. Com quem elas vão deixar as crianças?", questionou. O desenvolvimento econômico deficiente na Baixada impulsiona seus municípios a se transformarem em cidades-dormitório, como são chamadas aquelas nas quais grande parte da população realiza suas atividades diárias, principalmente o trabalho, em outra cidade.

O movimento de pessoas de uma cidade para outra utilizando transporte público, chamado de fluxo pendular, é comum nas cidades-dormitório, embora seja visível também dentro da própria Baixada, onde existem municípios com melhor infraestrutura em relação a outros. É o caso descrito por Gustavo Ferreira, morador de Belford Roxo e estudante de Engenharia Civil da UERJ, que participou da palestra. "Eu tenho de vir para o Rio para trabalhar e estudar. Mas na própria Baixada acontece isso. O morador do bairro de Santa Teresa, em Belford Roxo, tem de pegar três conduções para o centro da cidade. Mas para ir para Duque de Caxias, é necessária apenas uma. O que o morador vai fazer? Vai consumir lá, em Caxias", afirmou ele.

Gestão Integrada
A primeira atitude que devemos ter é reconhecer o problema. E o primeiro passo está sendo dado agora, com a Câmara Metropolitana de Integração Governamental", afirma Luiz Edmundo. A Câmara, da qual participam 21 prefeitos e o governador do estado do Rio de Janeiro, é um órgão estadual criado em 2014 com base na Constituição e no Estatuto da Metrópole, depois que o Supremo Tribunal Federal julgou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 1842, de 2013. A decisão do STF definiu que a gestão dos municípios na região metropolitana do Rio de Janeiro deve ser compartilhada entre prefeituras e governo do estado, respeitando as devidas autonomias legais. Luiz Edmundo citou que a gestão integrada pode auxiliar, por exemplo, no sistema de transporte público: muitos ônibus circulam entre municípios, e uma gestão compartilhada é mais eficiente para mitigar problemas que ocorrem nesse sistema. "A esperança é que a Câmara possibilite racionalidade na gestão das cidades", disse o engenheiro, que acredita que o norte desse tipo de ação cooperada deve ser a redução de desigualdades sociais a partir de políticas públicas para o desenvolvimento urbano da Baixada, enfrentando questões como a regularização fundiária, melhorias no sistema de transporte público, incentivo à atividade industrial, logística e saúde. Atualmente a Câmara elabora o Plano Estratégico Metropolitano -- e um dos desafios vislumbrados por Luiz Edmundo já tem sido a situação fiscal problemática do governo do estado hoje.

"Já houve tentativas de se planejar, como está sendo feito agora com a Câmara", afirmou José Stelberto Porto Soares, subchefe da Divisão de Recursos Hídricos e Saneamento (DRHS) do Clube de Engenharia. O engenheiro citou um antigo estudo de vocações feito na Baixada Fluminense pela Secretaria de Planejamento do município do Rio para identificar os potenciais de indústria em cada cidade. Segundo ele, que trabalhou na secretaria, hoje extinta, a integração de políticas públicas entre municípios é fundamental, embora a fonte de recursos ainda seja um problema.

"A Baixada Fluminense tem o contingente eleitoral mais importante do estado do Rio de Janeiro, mas isso não se reverte em benefícios políticos. Proporcionalmente, a região recebe muito menos do que eleitoralmente pesa na política do estado", criticou Saturnino Braga, conselheiro do Clube de Engenharia, ex-senador, ex-prefeito do Rio e presidente do Centro Celso Furtado.

Sociedade deve se organizar
Os problemas sociais enfrentados na região da Baixada colaboram para o preconceito contra moradores da região. "Quando eu dizia para as pessoas que estava trabalhando em Duque de Caxias, a primeira pergunta que faziam era se eu tinha de ir lá todos os dias", disse Luiz Edmundo da Costa Leite. O palestrante apontou o "êxodo" que existe entre moradores que, assim que ascendem economicamente, mudam para a capital ou outras cidades. O estudante Gustavo Ferreira também lamentou: "É uma questão crônica da Baixada. Se eu aumento meu padrão de vida, intelectual e financeiro, eu vou mudar para o Rio de Janeiro, para a zona sul ou Barra", disse ele. 

Paralelamente à proposta de gestão integrada dos municípios, e também como forma de enfrentar o preconceito, os participantes do evento destacaram ações vindas da sociedade civil. Gustavo Ferreira criou junto com amigos a página no Facebook "Eu amo Bel", que reivindica melhorias para o município de Belford Roxo ao mesmo tempo em que procura resgatar o orgulho de se viver por lá. "Se queremos planejar o futuro, precisamos entender o passado. Muita gente em Belford Roxo não sabe o porquê do nome da cidade. Não sabe que é o nome de um engenheiro, que trabalhou com Paulo de Frontin na época do chamado 'milagre das águas', no tempo do Império. As pessoas não sabem que o nome da cidade está relacionado a um fato histórico, o de fornecer água para a capital na época do Império. E hoje o que mais falta em Belford Roxo é água", lembrou.

Para Gustavo, iniciativas em sustentabilidade, tecnologia, educação e turismo são alternativas ao abandono e má gestão pública. "O que temos debatido em Belford Roxo é um tripé, que envolve sustentabilidade, economia -- com empreendedorismo e inovação --, e educação em questões históricas", disse ele. O estudante citou projetos que têm buscado empreender com os amigos na cidade, como a criação de um parque ambiental, um museu e um pólo tecnológico.

José Stelberto Porto Soares acabou trazendo uma proposta para o Clube de Engenharia, a de criar um núcleo de estudos da Baixada Fluminense. E o conselheiro Saturnino Braga defendeu a ideia: "A proposta de formar um grupo aqui no Clube de Engenharia é ótima. O Clube tem essa capacidade de pensar, planejar, ou pelo menos olhar com atenção para a Baixada", disse ele.

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