Acabar com o horário de verão é ação populista?


Wagner Victer*

Na administração pública é fundamental que as decisões sejam tomadas baseadas em informações técnicas e não somente em ações que visam agradar a opinião pública.

Infelizmente se administrarmos o país como um Big Brother colhendo as opiniões momentâneas para as tomadas de decisão não estaremos nos aproximando do melhor exercício da democracia e sim “costeando o alambrado” do populismo e na história do mundo, em especial do nosso país, temos centenas de exemplos negativos!

Administrar pensando somente na fotografia momentânea muitas vezes pode soar como estratégia diversionista para tirar o foco de problemas distintos daqueles que estão sendo conduzidos na decisão tomada. Ter sensibilidade e ouvir opinião pública é importante, porém estabelecer um sistema de “agradocracia” é extremamente perigoso.

O Horário de Verão que, segundo veiculado na imprensa, alguns querem, depois de décadas de implantação no país, eliminar, pode ser mais um exemplo deste tipo de prática de “agradocracia”.

Fui por oito anos Secretário de Estado de Energia do Estado do Rio de Janeiro e junto com os técnicos experientes, diversos órgãos do próprio Governo Federal, como do Ministério de Minas e Energia, ANEEL, Eletrobras, Furnas e ONS (Operadora Nacional do Sistema), um dos que defendeu a continuidade do Horário de Verão. O Horário de Verão tem sido adotado de maneira rotineira no Brasil, até porque não é uma “jaboticaba brasileira", nem para os críticos de rede social "mais uma invenção petista" ou uma "ação neoliberal derivada do Consenso de Washington", até porque dezenas de países espalhados na Europa e no próprio continente americano, como os Estados Unidos, adotam rotineiramente o Horário de Verão.

Seriam então esses técnicos brasileiros, de diversos órgãos, que, aliás, muitos lá ainda estão em cargos chaves, mentirosos e incompetentes? Seriam os outros países que adotam o horário de verão, países loucos? Claro que não!!!

Realmente o Horário de Verão no Brasil traz uma economia geral de energia pequena, em alguns anos, inferior a 1% e que, aliás, por si só já justificaria a sua adoção. O Horário de Verão, porém, traz diversos outros benefícios, alguns para o próprio setor elétrico e outros até como externalidades para outros segmentos econômicos, ambientais e para a própria segurança pública, que não podem ser ignorados e que subsidiam sua adoção em um grau superior de razoabilidade muito maior que a própria economia de energia obtida.

No Horário de Verão, pelo melhor aproveitamento da luz solar, historicamente se reduz a demanda de ponta, também chamada de demanda de pico, da ordem de 4%, o que reduz o risco de carregamento do setor elétrico e muitas vezes a operação de sistemas específicos de geração para atender essa própria demanda como as termelétricas e, portanto, tem reflexo no próprio custo de energia repassado ao consumidor. No meio ambiente, pela redução de geração de energia, também é reduzida a emissão de gases para atmosfera e o próprio consumo de água para operação de sistemas hídricos e térmicos de geração, e logicamente o menor carregamento de carga em diversas linhas de transmissão e equipamentos de subestações elétricas, e não é por outra razão que o próprio Operador Nacional do Sistema elétrico, ONS, que opera o Sistema Interligado Elétrico Nacional, sempre validou sua adoção.

No aspecto econômico, em especial para um país que tem da ordem de 8 mil quilômetros de Costa Marítima e que tem na atividade de turismo algo importante, o Horário de Verão é um elemento importante para muitas cidades turísticas aumentando as práticas esportivas ao ar livre (beneficiando também a saúde), o comércio de rua, em especial das regiões praianas e o próprio maior aproveitamento da beleza natural que ofertamos para nossos turistas e para aqueles que saem do seu trabalho ainda com a luz do dia. Ou seja, o Horário de Verão tem um impacto positivo e relevante no consumo, em nossa economia e na geração de emprego.

Na própria área de educação o Horário de Verão proporciona o retorno ao lar para aqueles que estudam em tempo integral ou à tarde ainda com a luz solar e a ida para escola também com iluminação natural com reflexos para área de segurança pública. Tal exemplo também se desdobra para dezenas de outras áreas.

É claro que no Horário de verão muitas pessoas têm dificuldade de adaptar seu relógio biológico, em especial nas primeiras semanas, principalmente aqueles que têm que ir cedo para o trabalho ou para a escola, porém os benefícios tangíveis e principalmente os intangíveis na adoção do Horário de Verão são bastante óbvios e por essa razão ele tem sido adotado no país e no exterior por décadas.

É muito importante que o tema até surja como provocação para reflexão da sociedade quanto à importância do Horário de Verão, porém não há a mínima dúvida que incorreremos num grande equívoco pelas razões apresentadas, já que transformar adoção do Horário de Verão não em uma questão técnica econômica, mas sim em uma decisão plebiscitária em forma de enquete ou “marqueteira” é algo totalmente descabido como se políticas públicas fossem um “reality show”.

*Wagner Victer é Engenheiro, Ex-secretário de Energia, Indústria Naval e Petróleo, Ex-membro do Conselho Nacional de Políticas Energéticas (CNPE), Secretário de Estado de Educação, Membro da Academia Nacional de Engenharia e Conselheiro do Clube de Engenharia.

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