CORREIO SATURNINO | Artigo nº 275/2013

por Saturnino Braga

Tenho a sensação de que a questão do transporte urbano ainda não está sendo politicamente considerada no Brasil com a prioridade que está a exigir. Era já uma questão bastante grave faz meia dúzia de anos; agora, com a entrada em tráfego do enorme contingente de automóveis que a redistribuição de renda propiciou, muito auxiliada pelos estímulos fiscais concedidos à indústria automobilística, pela contenção dos preços dos combustíveis (com grande prejuízo para a Petrobrás) e pelas facilidades de financiamento para a compra de carros, agora o quadro grave se fez calamitoso. Em todas as nossas cidades; possivelmente no Rio mais do que em todas as outras.

O tremendo mal-estar que a população enfrenta diariamente, toda manhã e toda tarde, de espera em filas e grande desconforto na condução durante quatro horas ou mais, com ida e volta, produz coletivamente um desgaste físico e psíquico tão pesado que, com certeza, constitui já grave problema de saúde pública.

Adicione-se a esse gigantesco sofrimento humano o inevitável aumento da taxa de acidentes no trânsito e o enorme prejuízo econômico resultante da perda de produtividade do trabalho, do desperdício de combustível nos engarrafamentos e da poluição atmosférica cada vez mais densa, e ter-se-á, nítido o desenho da calamidade pública.

Não constitui acaso o fato de ter sido um razoável aumento de passagens o estopim para a explosão de protesto que sacudiu em junho todo o País: o maior protesto público da História do Brasil. O problema do transporte urbano constitui hoje, para nós, uma prioridade de grau equivalente ao da educação e ao da saúde E tem até mesmo uma imbricação perversa com eles, na medida em que agrava muito o mau estado da saúde pública dos brasileiros e toma das pessoas um largo espaço de tempo que poderia ser aplicado em importantes aperfeiçoamentos educacionais e culturais.

Quero me referir à questão dos royalties do petróleo para sustentar que o transporte público deveria ter também uma parcela mínima da aplicação desses recursos. Os investimentos em trens urbanos e metrôs são extremamente pesados e absolutamente urgentes e necessários. O BRT, novo sistema de ônibus, é de fato uma iniciativa louvável, que traz melhorias notáveis, mas que está longe, realmente longe de resolver os problemas dos fluxos maiores de passageiros nas grandes metrópoles.

Nosso sistema político foi capaz de criar uma democracia das mais avançadas do mundo mas vai parecendo pouco sensível para captar esta prioridade maior das ruas do Brasil. No Rio, por exemplo, onde a calamidade se manifesta talvez com mais intensidade, grandes investimentos estão sendo feitos nas linhas de metrô e VLT; mais, entretanto, por exigência da realização das Olimpíadas em 2016 do que por atendimento a pressões políticas ligadas a esta questão calamitosa do transporte urbano. Uma evidência desta distorção está no fato de que esses grandes investimentos não estão contemplando, em nada, a enorme e sofredora população da Baixada Fluminense; simplesmente porque lá não se darão espetáculos da grande competição olímpica.

A esperança está em que na campanha da próxima eleição para o Governo Estadual os candidatos tenham sensibilidade para a dimensão e a importância do problema. Um problema que acaba recaindo na responsabilidade dos governos estaduais, na medida em que transcende os limites dos municípios das capitais e não existe, no Brasil, a instância governamental das regiões metropolitanas.

Receba nossos informes!

Cadastre seu e-mail para receber nossos informes eletrônicos.

O Clube de Engenharia não envia mensagens não solicitadas.
Pular para o conteúdo