Por Márcio Patusco | Instituto Telecom | 10 de Junho

O Brasil tem perdido oportunidades importantes para universalizar alguns de seus serviços de telecomunicações essenciais para a população. À exceção do STFC (telefonia fixa), que é um serviço prestado em regime público, todos os demais serviços são prestados em regime privado, ou seja, não têm obrigações de universalização. Isso traz distorções de atendimento importantes, tanto entre classes de renda, como entre regiões do país. Como conseqüência, temos um abismo de inclusão digital que não se tem conseguido superar.

No recente edital de licitação da faixa de 700 MHz, para prestação do serviço celular 4G, vamos repetir o erro de não colocar metas de cobertura para os vencedores de uma faixa de frequências das mais importantes para uma melhoria e abrangência de nosso serviço de banda larga móvel. Aos vencedores do leilão serão emitidas licenças nacionais de prestação de serviço que não imporão regras, ficando a decisão ou não de atendimento das diversas regiões do país inteiramente nas mãos das operadoras. Pode-se depreender perfeitamente destas condições onde serão os pontos preferenciais para a localização desta infraestrutura, privilegiando sempre o retorno financeiro, acentuando com isso as diferenças sociais e regionais que atualmente já temos.

O leilão da faixa de 700 MHz segue um ritual de licenças “verticais”, onde os vencedores implantam toda a infraestrutura para a prestação do serviço, desde os protocolos de rede ate os protocolos de distribuição dos sinais, passando pelos sistemas de back office que dão suporte ao serviço. Cada empresa vencedora da licitação, prevê-se pelo menos 6 licenças a serem adquiridas, deverá implantar todos estes sistemas e equipamentos sem compartilhamentos significativos de infraestrutura. Isso é o que vem sendo feito em todas as licitações por aqui, e também na grande maioria dos países. Não existiria alternativa mais econômica? Mais dentro da realidade de países com interesse na universalização do serviço? Com uma preocupação maior nos custos e na forma de sua efetiva cobrança ao usuário?

Sim, existe. Essas perguntas vêm sendo respondidas pelo edital de licitação da mesma faixa de 700 MHz idealizada pelo México. Inicialmente, durante o ano de 2013, os legisladores mexicanos incluíram na Constituição Federal a conectividade como um direito do cidadão. Criaram um novo órgão regulador, o Ifetel – Instituto Federal de Telecomunicaciones -, com maiores poderes, e vão leiloar a faixa de 700 MHz para uma única empresa privada que será responsável pela instalação da infraestrutura, correspondente aos recursos de rede, cabos, fibras, antenas, etc., para provimento do serviço no atacado, com obrigações de cobertura. Esta empresa colocará a sua infraestrutura, a preços estabelecidos pelo Estado, para ser utilizada por empresas virtuais (MVNOs),  na prestação do serviço no varejo. Estima-se que existirão milhares de empresas virtuais nesse mercado, desde os tradicionais prestadores de telecomunicações, como também os prestadores de aplicações OTTs (over the top) que atuarão em nichos específicos, num ambiente de competição e inovação.

A par do ineditismo técnico de separação da prestação do serviço em camadas de atacado e varejo, outras duas preocupações se distinguem da implementação em relação ao modelo brasileiro. Primeiro, o estabelecimento de obrigações de cobertura à empresa de atacado, fazendo com que esta tenha que atender regiões onde não haja obrigatoriamente retorno financeiro. E, segundo, o de controle de custos, de modo a se prover o serviço com modicidade tarifária ao usuário. Estas preocupações se revelam importantes no sentido de não deixar ao mercado as soluções de atendimento em uma região onde exista uma dominância de empresas com poder de mercado significativo, que naturalmente optarão por soluções que privilegiarão o seu retorno financeiro.

O setor de telecomunicações a cada dia se torna mais dinâmico. Cabe aos reguladores acompanharem essas mudanças no objetivo de oferecer soluções que venham beneficiar a sociedade. Não se trata de simplesmente adotar modelos de outros países que eventualmente não se adequem à nossa realidade, mas de estudar, discutir e decidir por medidas inovadoras que melhor atendam às necessidades de um país ainda carente por soluções adequadas à sua população.  Temos discutido pouco os caminhos por onde devem trilhar nossas telecomunicações. Não existe sequer um fórum onde todos os interessados nesta discussão possam expor suas ideias. Aliado aos resultados pouco alentadores de nossa indústria, parece hora de se promover o incentivo a uma discussão aberta do rumo desse mercado com vistas a alavancar o setor.

 

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