O Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio de Janeiro (Crea-RJ), com apoio do Clube de Engenharia e do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge-RJ), organiza, entre outubro e dezembro, o ciclo de debates "Crise da Engenharia Nacional”. Nos diferentes encontros, acadêmicos, engenheiros e outros especialistas debatem tópicos que influenciam o crise no mercado de trabalho e nos setores produtivos da área. A seguir, divulgamos os três primeiros debates.

Privatização da Eletrobras
No primeiro encontro, realizado em 18 de outubro, engenheiros e acadêmicos discutiram o processo de privatização do Sistema Eletrobras, assim como desafios do setor elétrico e sua relação com o desemprego entre engenheiros.

"A questão do desemprego é foco central nesse ciclo de palestras", disse Paulo Cesar Smith Metri, presidente em exercício do Crea-RJ, na abertura do evento. "É bom salientar que, no modelo atual, o desemprego é necessário para que se crie uma reserva de mão de obra desempregada, já que isso baixa o salário médio dos brasileiros. O caso dos engenheiros não é diferente. A  saída é uma mudança no modelo de país", afirmou. 

O professor Luiz Pinguelli Rosa, diretor de Relações Institucionais da Coppe/UFRJ, lembrou que a privatização do Sistema Eletrobras é um debate que tem movimentado diferentes setores da sociedade recentemente. "Há uma convicção profunda no governo de que se deve privatizar. E, quando há críticas a isso, elas são vistas como ideológicas", lamentou ele. "A privatização reflete a ideia de transformar o Brasil em grande espaço para expansão das empresas estrangeiras — uma boa parte delas estatal", observou. 

 

"Em termos de política energética, essa é a proposta de mudança mais radical dos últimos 60 anos", salientou Ronaldo Bicalho, doutor em Economia da Indústria e da Tecnologia e pesquisador do Instituto de Economia da UFRJ. "A privatização resolve os problemas do setor elétrico? Não, e ainda torna mais difícil sua resolução. A agenda do setor, e a agenda do mundo como um todo, vive um momento delicado por conta da transição elétrica, de sair da base de combustíveis fósseis para os combustíveis limpos. É o maior desafio do setor em todo o mundo desde seu surgimento", afirmou, lembrando que a organização da cadeira produtiva ainda é uma incógnita, assim como as políticas públicas necessárias para isso. Em função disso, afirma Bicalho, deve ser o Estado o gerenciador dessa transição.

Antes de abrir o debate com os presentes, o moderador Sebastião Soares, primeiro-vice-presidente do Clube de Engenharia, salientou que o Brasil é "a grande nação do século 21", mas que para isso se cumprir é preciso reinventar a democracia, que deve ser mais participativa de modo a discutir amplamente na sociedade movimentos como as privatizações. "Temos desafios enormes para enfrentar, e acho que estamos passando por um problema complicado porque as instituições brasileiras precisam ser reinventadas", salientou ele, que é engenheiro de minas e geólogo, ex-engenheiro do BDNES e ex-secretário nacional de Planejamento e Investimento Estratégico.

Assista ao debate completo no Youtube 

Resgate da Petrobras para os brasileiros
Movimentos recentes na Petrobras, como o leilão dos blocos do pré-sal e a venda de ativos, têm preocupado a sociedade e foram temas do segundo debate do ciclo, realizado em 25 de outubro.

Guilherme Estrella, geólogo e ex-diretor de exploração e produção da Petrobras, líder da equipe que chegou às reservas do pré-sal, lamentou a atual situação da empresa. "A Petrobras está morrendo, essa é a verdade", disse ele ao fazer um retrospecto do florescimento da indústria energética no Brasil e o papel protagonista da petroleira neste histórico. Para o conselheiro do Clube de Engenharia, o desenvolvimento tardio coloca o Brasil em patamar especial, com grande potencial de crescimento em relação a outros países. A Petrobras, que poderia se manter como protagonista nesse processo, hoje está ameaçada pelas privatizações e desmonte.

Para César Prata, vice-presidente da Associação Brasileira das Indústrias de Máquinas (Abimaq), a importância da petroleira estatal se dá não apenas pelas suas atividades em si, mas também porque a empresa impulsionou o desenvolvimento tecnológico no Brasil. "No caso da indústria, essa indução sempre foi vista positivamente. A  Petrobras 'provocava' a indústria a se desenvolver para atendê-la", disse. "Hoje nós perdemos isso. A Petrobras quer fugir de nós, a indústria nacional. O principal cliente dela é o povo brasileiro, mas o segundo maior cliente é a indústria nacional", refletiu César. 

Antes de abrir para o debate com os presentes, o moderador Fernando Siqueira, vice-presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobras (Aepet) e conselheiro do Clube de Engenharia e do CREA-RJ, criticou os movimentos políticos que levaram ao desmonte atual da petroleira. "O Brasil está sendo muito ameaçado hoje, não apenas a Petrobras", disse, lembrando das revelações feitas em 2013 por Edward Snowden, ex-administrador de sistemas da CIA e da NSA (Agência de Segurança Nacional dos EUA), que trouxe a público o programa de vigilância massiva que o governo americano utilizava contra cidadãos do país, autoridades estrangeiras e até mesmo a Petrobras. "Convidado para participar de uma CPI na Alerj e explicar as razões da venda de ativos, o presidente Pedro Parente conseguiu uma liminar na Justiça permitindo que ele não fosse e não mostrasse os dados dos contratos que estão sendo feitos para vendas de ativos", criticou Fernando. Apesar de a liminar ter sido revogada, ainda não havia data para nova convocação.

Assista ao debate completo no Youtube.

Engenharia, ciência e tecnologia
A crise da Engenharia no âmbito da ciência e tecnologia nortearam os debates do terceiro encontro, realizado em 8 de novembro. 

 

A relação direta entre as medidas de austeridade econômica recentes, o desemprego e os cortes no orçamento de pesquisa e desenvolvimento das universidades teve ênfase na fala do professor Carlos Alberto Cosenza, da Escola Politécnica da UFRJ. “A ciência e tecnologia estão tendo uma queda extraordinária. Estamos fazendo papers para ter pontos com a CAPES e CNPq, mas elas não têm dinheiro para nossas pesquisas. Os pesquisadores estão ajoelhados, e não se dá importância à formação de recursos humanos de alto nível. Estamos perdendo nossos cérebros”, criticou. 

Fernando Uchôa, conselheiro e ex-presidente do Clube de Engenharia, conclamou a união das entidades. “Para nós, engenheiros, o desemprego pega de frente. Mas por que não estamos organizando uma resistência a esse cenário? É preciso juntar as entidades de Engenharia para debater uma frente de luta, o momento exige isso”, disse. 

“Existe um encadeamento virtuoso entre ciência, tecnologia, engenharia, industrialização e desenvolvimento soberano, sustentável e inclusivo”, afirmou Sebastião Soares, no debate que se seguiu às falas dos palestrantes. “Temos de assegurar, por exemplo, o conteúdo local na indústria para que exista desenvolvimento da atividade produtiva”, afirmou.

Também participou da discussão, como palestrante, Nelson Maculan, professor da COPPE/UFRJ e ex-reitor da universidade.

Assista ao debate completo no Youtube.

Sobre o ciclo de debates
Em seis encontros, especialistas convidados pelo Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio de Janeiro (Crea-RJ) discutem a urgência atual da Engenharia Nacional — a geração de empregos —, a partir de debates sobre os setores elétrico, de petróleo e gás, de mineração e de infraestrutura, além de tratar de temas como sucateamento de empresas de engenharia, desafios à ciência e tecnologia e soberania nacional.

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