Parque Olímpico na Barra da Tijuca. Na ocasião das Olimpíadas, o bairro recebeu 16 licenças de alvará para construção, reforma ou reconversão de uso para atividade hoteleira. Foto: Wikipedia.

Em dezembro de 2020, o Ministério da Economia lançou a Resolução 64/20, decidindo sobre o Licenciamento Urbanístico Integrado. Mas a resolução, de responsabilidade do Comitê para a Gestão da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (CGSIM), passava por cima das legislações municipais referentes a obras, estabelecendo uma classificação de risco das mesmas e diferenciando os procedimentos. Este foi o tema do evento "Desregulamentação urbanística e seus impactos sobre o mercado de Engenharia e Arquitetura", realizado online.

Como palestrantes participaram Sidnei Menezes, arquiteto e urbanista da Prefeitura do Rio e ex-presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo (CAU/RJ), e Sandra Sayão, arquiteta e urbanista, diretora da ArquiArqui Arquitetura, ex-presidente Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura ASBEA/RJ e Conselheira do CAU/RJ. Com promoção do Clube de Engenharia, Diretoria de Atividades Técnicas (DAT) e Divisão Técnica de Engenharia Econômica (DEC), a coordenação foi de Mauro de Souza Gomes, chefe da DEC.

Facilidade nem sempre é solução

A Resolução, vinda do governo federal, pareceu uma solução para os problemas que engenheiros e arquitetos vivem para licenciar obras de acordo com as legislações municipais: o processo é moroso e confuso. Para Sandra Sayão, a "facilidade" representada pela nova legislação pode ser uma armadilha, à medida que deixa muitas lacunas sobre os procedimentos. Ao mesmo tempo, representa um anseio de empresários, arquitetos e engenheiros pela simplificação do processo. Segundo avalia Sandra, hoje o investimento em qualquer produto imobiliário ou urbanístico é muito alto, porque não há prazo definido para o tempo de aprovação. À medida que se envia documentação para a prefeitura, pode-se avançar ou retroceder no processo, pois sempre são encontradas inconformidades.

Na cidade do Rio de Janeiro, especificamente, vigoram várias legislações, segundo a arquiteta. "Temos a lei 198, aprovada em 2019, que é a simplificação do Código de Obras. Temos o decreto 322/1976, temos o decreto 3.800/1970, que terminou para a parte de edificação, mas para a parte urbanística continua valendo. Entre várias outras: Plano de Estruturação Urbana (PEU), Área de Proteção do Ambiente Cultural (APAC), órgãos de tutela do patrimônio". Ou seja, falta uma unificação de todas as normas e um sistema simples, um programa online matemático em que se possa compreender o que o município exige em cada região.

Também para Sidnei Menezes a resolução expressa uma demanda dos profissionais envolvidos com licenciamento no caminho da simplificação e agilização do processo. "Só que esse processo é de prerrogativa dos municípios, então não adianta uma lei federal dizer que vai ser simplificado porque lá na ponta não vai acontecer isso. Pelo contrário: o que vai acontecer é novamente passar por cima das legislações, não levar em consideração a questão ambiental, nem a questão urbanística, terceirizar o processo de licenciamento para o setor privado", afirmou.

Sidnei lembrou que a responsabilidade técnica do licenciamento recai sobre um arquiteto ou engenheiro servidor público da prefeitura, que vai assinar a possível liberação, o que faz com que seja mais exigente. O ideal, segundo entende, é dividir as responsabilidades entre mais profissionais e agilizar o processo. Impossível não seria: na ocasião das Olimpíadas, em 2016, foi feita uma verdadeira "força tarefa" para licenciar empreendimentos em tempo recorde. "Durante as Olimpíadas, foi criada uma excepcionalidade para os investimentos hoteleiros. Criou-se força tarefa em todas as secretarias, e em tempo recorde se licenciava hotéis enormes, principalmente na Barra da Tijuca, no Recreio. Na época, hotéis foram liberados em até seis meses. Então é isso que tem que ser feito, mas no geral".

A agenda econômica e as lacunas de informação

No entanto, Sidnei não acredita que o aparecimento da resolução vá estimular os municípios a simplificarem, informatizarem e agilizarem os processos. Ao mesmo tempo, a resolução pode voltar à tona, porque sua demanda existe. Para ele, a revogação é apenas "cortina de fumaça" para um futuro retorno, porque esta corresponde a uma agenda econômica do governo, com o discurso de burocratização. A agenda urbanística fica de lado. Caso entre em vigor, permanecem dúvidas sobre seu funcionamento, a exemplo de um aspecto: o Mercado de Procuradores Digitais de Integração Urbanística de Integração Nacional (Murin), ou seja, um conjunto de profissionais responsáveis pela dispensa de licenciamento do alvará de construção e habite-se para obras consideradas de baixo risco.

Para Sandra Sayão, permanece a dúvida se esse profissional, de fato, terá conhecimento de todas as leis, resoluções e condições que o município impõe. Esta e muitas outras dúvidas, pois a resolução, do modo como foi criada, não deixa claro quem decide o quê. Fica a oportunidade para as prefeituras simplificarem o processo e flexibilizarem, o que poderá inclusive gerar uma cidade mais criativa, na visão de Sayão, uma vez que hoje qualquer inovação aparece como inconformidade e barra o processo.

Para o coordenador do evento, Mauro Gomes, as entidades deveriam ter debatido a proposta desde seu início, analisando as virtudes da mesma como, por exemplo, a desoneração do encargo custoso que é o licenciamento. Ao mesmo tempo, estão inclusas no texto original da resolução todas as problemáticas citadas. Para ele, este é o momento de fazer, nas instituições, o debate que não foi feito no início, inclusive porque a Resolução foi revogada para ser revisada por um grupo de trabalho que poderá receber contribuições.

Receba nossos informes!

Cadastre seu e-mail para receber nossos informes eletrônicos.

O Clube de Engenharia não envia mensagens não solicitadas.
Pular para o conteúdo