Por Edson Monteiro*

Há que reconhecer que o papel da mulher no mundo ultrapassa em muito o contido na concepção do Gênese hebraico. Vê-la apenas como companheira do homem ? destinada a dar-lhe a alegria da não-solidão ? é, no mínimo, uma simplificação presunçosa e tacanha, ainda que o homem, muita vez, a busque apenas com o propósito da satisfação carnal ou do domínio físico exploratório.

O Tempo (Cronos) , filho de Gaia (Terra) e de Urano (Céu), na sua vingança a favor da mãe e contra o pai, não impediu que a Fúria (nascida de sua vingança) se encarregasse de fazer surgir a Afrodite dos encantos femininos junto com a capacidade de buscar os seus direitos de mulher e de influenciar as sociedades do então porvir.

Essa é a história, tanto no viés poético de Hesíodo, quanto nos registros seculares que desfilam mulheres notáveis, individual ou coletivamente, transformadoras mártires de uma sociedade machista e retrógrada, cujos homens dominadores mostraram-se incapazes com suas atitudes de reconhecer na doce e sensual figura feminina, mais que curvas “venusianas”, mas também e, talvez, principalmente um coração sensível e uma mente aberta a tantas lutas e conquistas.

Na Nova York de 08 de março de 1857, operárias de uma fábrica têxtil recusaram-se ao trabalho porque buscavam redução da jornada diária para dez horas (eram dezesseis) e equiparação salarial com os homens (seus salários eram, no máximo, 1/3 daqueles dos homens de trabalho equivalente). Foram trancadas e queimadas vivas. Morreram cerca de 130 mulheres.

Somente 53 anos depois desse episódio, já em 1910, a Dinamarca propõe o Dia Internacional de Mulher e o comemora na data de 08 de março, como homenagem àquelas mártires.

Mas na data de 28 de fevereiro de 1909, por iniciativa do Partido Socialista da América, antes, portanto, da celebração dinamarquesa, homenageiam-se aquelas mulheres de 1857 e prepara-se a 1ª Conferência Internacional das Mulheres, por iniciativa da Internacional Socialista, onde a ativista Clara Zetkin sugere a criação do “Dia”, iniciativa frustrada por desacordo entre as datas.

Em 19 de março de 1911, com cerca de um milhão de participantes, Áustria, Dinamarca, Alemanha e Suiça juntam-se para celebrar o Dia Internacional da Mulher em seus respectivos domínios.

Em 08 de março de 1917, mulheres russas se rebelam contra o czar Nicolau II e contra a entrada da Rússia na 1ª Guerra Mundial, o que no dizer de Leon Trotsky deixou-o surpreendido pela adesão feminina total à greve que, efetivamente, viria a inaugurar a revolução. Neste episódio, ligado ao direito de participação nos destinos da sociedade e não prioritariamente à igualdade de oportunidade e isonomia no trabalho, percebo com mais significação o papel da mulher no destino do Homem. O futuro provaria isto!

Somente em 1919, em Nova York, na fábrica da têxtil Triangle, num episódio bem parecido com a tragédia de 1857, ocorre um incêndio que flagela 146 costureiras. A historiadora Eva Blay atribui à repercussão americana deste episódio ? que não é o pioneiro ? a sua adoção como motivador do Dia Internacional da Mulher, homologado pela ONU no ano de 1977, depois de ela própria ter considerado o ano de 1975 como O Ano Internacional da Mulher.

Tantos e diferentes acontecimentos contêm os traços comuns da prepotência masculina e da consciência de heroínas que, contra tudo e quase todos, sacrificaram-se em verdadeiras revoluções na busca da natural ocupação cósmica. A mulher vitoriosa foi o instrumento libertador de seu gênero, nada inferior ao do homem no que tange à natureza humana e suas potencialidades.

Os momentos resumidamente relatados mostram que a libertação buscada, cerne da consciência de igualdade surgida do idealismo renascentista, não conheceu fronteiras, e até aqui na América do Sul e, particularmente, no Brasil repercutiram esses movimentos, cujos resultados mais flagrantes são as presenças da mulher em postos de comando e de atuação profissional dos mais altos níveis. O nosso continente já conta com três mulheres presidentes de três importantes países do hemisfério e, independentemente de cores partidárias ou ideológicas, há que destacar a importância da presença de todas elas, acolhidas pelo voto de seus respectivos povos no concerto democrático.

Enfim, seja qual tenha sido a causa determinante da data de 08 de março como Dia Internacional da Mulher, trata-se de importante evento na civilização de Gaia poetizada pelo gênio de Hesíodo. Cronos, como sempre, tratou direitinho do destino das coisas.

* Conselheiro e membro do Conselho Editoral do Clube de Engenharia 

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