Professores e engenheiros criam central de reparos de ventiladores mecânicos

Parte da equipe do projeto. Da esquerda para a direita: Maurício Motta (segurando um símbolo do CEFET), Filipe Nascimento, Carlos Travessa, Aldecir Araújo, Paulo Nascimento, Alexandre Pinhel e Júlio Santos. Foto: Arquivo de Alexandre Pinhel.

Em meio à pandemia, e à crise internacional no sistema de saúde, um dos equipamentos mais importantes, nos casos graves da Covid 19, é o ventilador mecânico. Também chamado de respirador pulmonar, seu papel é inserir ar no pulmão do paciente quando ele já não tem condições de respirar. O Brasil não somente possui poucos respiradores para a crescente demanda como também existem muitos sem uso, por falta de manutenção, ou mesmo porque ficaram obsoletos. Para contribuir com a resolução de parte do problema, instituições, empresas, engenheiros e outros profissionais, em parceria com professores e alunos do Centro Federal de Educação Tecnológica Celso Suckow da Fonseca (Cefet-RJ) uniram-se, voluntariamente, para recuperar os ventiladores mecânicos do Estado do Rio de Janeiro, além da possibilidade de produção de novos aparelhos com impressão 3D.

O Clube de Engenharia, um dos parceiros, é representado pelo diretor técnico Fernando Tourinho, que vê, além das ações solidárias, muitos desdobramentos no período pós-pandemia. “Com 38 hospitais inscritos via um aplicativo criado especificamente para atender o projeto, a perspectiva é de avanços na formação profissional do Cefet, na área de engenharia mecânica, com cursos de reparos de aparelhos eletrônicos hospitalares voltados para atender inclusive à indústria”. Tourinho lembra ainda que “o fato do Cefet funcionar como centro das operações é garantia de alta tecnologia, trabalho de qualidade e a perspectiva de importante legado tanto no campo da educação quanto no campo da engenharia”.

Operação e gestão otimizadas

Segundo Maurício Motta, diretor eleito do CEFET-RJ, professor e coordenador do projeto, o plano é receber um primeiro lote expressivo de equipamentos e fazer uma triagem, baseada na complexidade do conserto, para otimizar a manutenção. Quanto à produção de novos ventiladores, com impressora 3D, a equipe trabalha o uso de dois modelos: Breath4Life e InVent. No momento, estão em fase de testes aguardando aprovação da Coordenação de Vigilância Sanitária de Portos, Aeroportos e Fronteiras (Anvisa).

As atividades têm previsão de início na segunda semana de maio concentradas no pavilhão do Curso Técnico de Mecânica do CEFET, com a prioridade de devolver aos hospitais e demais instituições de saúde os ventiladores mecânicos com problemas mais simples. Os que não tiverem mais aplicabilidade poderão ser desmontados para uso das peças. Para os aparelhos com carência de peças que não são mais fabricadas, poderá ser utilizada engenharia reversa para fabricação em impressora 3D.

A primeira demanda de consertos surgiu da Secretaria de Estado de Saúde. O Estado do Rio tem, segundo o DATASUS, 607 respiradores sem uso, sendo 402 do Sistema Único de Saúde (SUS). Cada respirador dá suporte, em média, a 10 pacientes. Por isso, nas palavras de Maurício Motta, "cada um faz diferença". Além deste primeiro "cliente" com uma alta demanda, outras unidades de saúde podem enviar seus equipamentos para conserto, assim como empresas e instituições podem se unir ao projeto de diversas formas. Além do Cefet, dois outros centros de reparos serão a Fiocruz e a montadora Jaguar Grande Rio, em Itatiaia. Empresas que já se uniram à iniciativa fornecendo insumos foram a Gerdau, produtora de aço, e a White Martins, que contribuirá com o fornecimento de gás.

O grupo ainda conta com a disponibilidade de engenheiros de diversas instituições e empresas voluntárias no reparo ou prestando assistência remotamente com suas experiências. Uma ferramenta criada para facilitar o contato entre unidades de saúde com respiradores parados e empresas interessadas na colaboração é o aplicativo SOSTecSaúde. Nele, podem ser cadastrados os equipamentos, já com especificações a respeito dos problemas, e a equipe de reparo atualiza a situação do conserto, gerando um relatório e comunicando a finalização.

Para o professor do Cefet, o que se criou em torno do projeto foi uma rede de solidariedade: docentes da instituição foram os primeiros a se voluntariar, convidando também amigos engenheiros com expertise, e instituições e empresas também agregaram. São profissionais das engenharias mecânica, elétrica, eletrônica e clínica, além do curso técnico de Enfermagem do Centro Educacional, que prestará todo o apoio necessário. Algumas das instituições envolvidas são Furnas, Associação Comercial do Rio de Janeiro (ACRJ), Instituto Nacional de Tecnologia, Instituto Brasileiro de Engenharia de Custos (IBEC) e Associação Brasileira de Engenharia Clínica. "A ideia é ser uma grande articulação para que a gente foque no reparo, porque o Rio de Janeiro está desassistido em núcleo de reparo de respiradores", defendeu Motta.

Educação e política de desenvolvimento

O professor do Cefet-RJ, assim como o diretor do Clube de Engenharia, avaliam que a experiência abre portas para investimentos em novas áreas de conhecimento, e cita a Engenharia Clínica, a partir da necessidade que se apresenta hoje de profissionais com essa formação específica. Motta também acredita que a atual crise com os equipamentos mais complexos no tratamento do Coronavírus escancara o problema da produção internacional, que seleciona somente alguns países para produção, e os que ficam de fora muitas vezes aceitam a condição de importadores e não produtores.

"É uma lição que essa crise passa para todos: o entendimento melhor do papel do Estado para salvaguardar essas questões de segurança", afirmou. Por fim, Maurício Motta comentou o engajamento de numerosos pesquisadores nas ações de combate à doença e o quanto isso deve ser observado pelas autoridades: "Os modelos alternativos de respiradores são frutos de conhecimento de vários pesquisadores que pararam suas linhas de pesquisa para se dedicarem a projetos de curto prazo. Isso mostra a necessidade de pessoal qualificado envolvido em pesquisa e desenvolvimento. É investimento. Quando o país precisar, deve poder contar com esses profissionais, e não acabar perdendo os cérebros para outra nação", conclui o novo diretor do Cefet.

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