A privatização da Eletrobras é um desserviço ao país e à Engenharia Nacional

Rio, 13 de dezembro de 2021

Excelentíssimos Sra. e Srs. Ministros do TCU

As entidades signatárias desta nota tornam público o seu repúdio à proposta do Governo Federal de capitalização da ELETROBRÁS, que na verdade se trata de um processo real de privatização.

Entendem que serão enormes os efeitos deletérios, no que tange à utilização adequada dos recursos hídricos, à economia e à soberania do país, com consequências diretas na Engenharia e na qualidade de vida, do emprego e na renda dos cidadãos brasileiros.

A ELETROBRAS, durante cinco décadas, planejou e construiu o maior sistema de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica integrado do mundo. Este sistema utiliza preponderantemente recursos hídricos renováveis e sustentáveis, sem dependência externa, que produz uma energia elétrica das mais baratas do planeta.

Ao longo deste período foram constituídas dezenas de empresas de Engenharia, de Indústria de Equipamentos e de Construção que desenvolveram conhecimento e tecnologia avançadas e reconhecidas internacionalmente, proporcionando milhares de empregos de qualidade para engenheiros, técnicos e operários, direta ou indiretamente ligados à atividade.
O sistema hidrelétrico construído teve seus custos de investimentos inteiramente pagos pelos consumidores ao longo de décadas por meio das tarifas, o que proporcionou, a partir de 2014, por ocasião da revisão das concessões, a redução dos custos de geração, favorecendo os consumidores com a modicidade tarifária.

Todo esse benefício será perdido com essa pretendida privatização, onde a lógica de maximizar o retorno dos investimentos no menor prazo se impõe, destituído de qualquer visão estratégica em relação aos interesses nacionais. O resultado mais evidente será a elevação tarifária a partir de bens públicos há muito amortizados.

Durante os últimos vinte e cinco anos, desenvolveu-se intenso processo de privatização das empresas do setor elétrico resultando em mais da metade da transmissão e da geração para as mãos de empresas privadas. Além disso, todos os empreendimentos de expansão vêm sendo feitos por estas empresas.

Ressalte-se que os motivos que justificaram as privatizações nunca foram alcançados - o aumento da modicidade tarifária e a segurança do abastecimento de energia elétrica. Pelo contrário, a explosão das tarifas pagas pelos consumidores e fatos inusitados como o apagão que deixou o Amapá por quinze dias sem energia elétrica.

Na realidade, o que vem ocorrendo é um processo de privatização voltado para interesses de empresas estrangeiras e fundos de investimentos, onde as conveniências externas e imediatas conduzem ao aniquilamento da Engenharia Nacional e o fechamento de dezenas de empresas e indústrias vinculadas ao setor elétrico. Associado a isto, a perda de domínio do conhecimento, o desemprego, o comprometimento da autonomia nas decisões e da soberania do país. Como consequência, amplia-se a dependência de combustíveis fósseis na composição da matriz energética nacional pari-passo à redução da segurança outrora oferecida pela hidroeletricidade no abastecimento interno. A vulnerabilidade do país às crises internacionais vem se agravando.

As ameaças se ampliarão com a privatização do Grupo ELETROBRAS, dado que ela cumpre a estratégica função de operar dezenas de usinas e de milhares de linhas de transmissão que garantem não somente a segurança do abastecimento energético, como a correta utilização dos recursos hídricos dos reservatórios. Estes recursos são de múltiplas e complexas utilizações, tais como: abastecimento de cidades, irrigação, pesca, turismo e lazer, navegação, controle de cheias e outros, sendo que alguns destes usos são conflitantes com a própria geração de energia.

Ademais, é um modelo exitoso, que encontra equivalentes tanto em países de modelos econômicos diversos, desde os fortemente planificados até os mais liberais como, por exemplo, a China e os EUA no qual uma empresa estatal fornece hidroeletricidade de baixo custo a sete estados do sudeste, incluindo o controle de enchentes, navegação e gerenciamento de terras, no entorno da importante bacia hidrográfica do Rio Tennessee.

Somente a operação integrada de um sistema elétrico pode propiciar a otimização da utilização dos recursos, tanto para a geração de energia como para outras finalidades. No Brasil, esta estrutura conta com o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), o órgão responsável pela coordenação e controle da operação das instalações de geração e transmissão de energia elétrica no Sistema Interligado Nacional (SIN) e a Eletrobrás participa da gestão das maiores bacias hidrográficas do país. Não bastasse a valorização deste arranjo estratégico, a escassez de recursos hídricos que se prevê no curto prazo, torna
mais ameaçador qualquer iniciativa que possa contribuir para a pulverização de interesses imediatos na gestão de insumos, tão importante à nação. Impõe-se, portanto, a necessidade da manutenção do poder do Estado, nas mãos da ELETROBRAS, com capacidade para exercer tal papel.

Para as entidades de Engenharia, a privatização do Grupo ELETROBRAS será uma ação nociva aos interesses nacionais e à nossa soberania, com impactos nos diferentes setores econômicos e ao cidadão brasileiro. A tarifa energética é fator essencial na competitividade industrial num país por construir, como o Brasil. Sua desestruturação, colocando o poder de geração elétrica nas mãos de terceiros, muitos deles representando nações estrangeiras, tornará o Brasil refém de um insumo construído a duras penas por brasileiros e empresas
nacionais.

Representa também a perda de capacidade do Estado Brasileiro para assegurar seu desenvolvimento tecnológico, industrial e o domínio do conhecimento, posto que sabidamente os investimentos nestes setores tem majoritariamente a contribuição estatal, sendo diminuta a participação privada.

Somos um país cuja Engenharia nacional já demonstrou sobejamente sua capacidade construtiva e criativa, superando adversidades territoriais e demonstrando enorme capacidade de gestão em vários setores, incluindo o elétrico, tendo a ELETROBRAS à frente. Mantê-la nas mãos do Estado é o caminho mais correto para os que querem um desenvolvimento nacional autônomo, soberano e que responda à urgente necessidade de melhoria da qualidade de vida dos brasileiros.

Por fim, além do caráter antinacional desse processo de privatização, preocupa-nos sobremaneira a manifestação da AEEL e CNE, protocolada neste TCU, ao nosso ver merecedora da máxima atenção por parte desta Corte.

Na expectativa de vossas atenções, subscrevemos,

Atenciosamente.

Marcio Girão
Presidente do Clube de Engenharia

Representando suas entidades, subscrevem este documento:

Adaedson Costa, Secretário Geral da Federação Nacional dos Petroleiros (FNP)

Deyvid Souza Bacelar da Silva, Coordenador Geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP)

Clovis Francisco do Nascimento Filho, Secretário-Geral da Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros (FISENGE)

Fábio Augusto Gomes Vieira Reis, Presidente da Federação Brasileira de Geólogos (FEBRAGEO)

José Manoel Ferreira Gonçalves, Presidente da Frente Nacional pela Volta das Ferrovias (FERROFRENTE)

Murilo Celso de Campos Pinheiro, Presidente da Federação Nacional dos Engenheiros (FNE)

Olímpio Alves dos Santos, Presidente do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (SENGE Rio)

Pedro Pinho, Presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobras (AEPET)

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