Travessia das barcas Rio/Niterói é mais cara que em NY

O preço das passagens das barcas que fazem a travessia da Baía de Guanabara ligando Rio de Janeiro e Niterói já eram uma das mais caras do mundo antes do novo aumento, no início do mês de abril.

A travessia da Baía de Guanabara, da Praça XV, no Rio de Janeiro, para a Praça Araribóia, em Niterói, um percurso de 20 minutos, já era a segunda mais cara do mundo no dia 2 de abril, quando foi aplicado o reajuste que elevou o preço das passagens para R$ 4,80. É o segundo reajuste em um ano. Em abril de 2012, o aumento foi de 60,7%. Somado ao aumento de 2013, de 6,7%, também em abril, a CCR elevou em 67% a sua passagem em um ano. Segundo levantamento recente, o percurso é mais caro que a linha que liga Wall Street à Rua 34, passando por Long Island. Ir a Niterói é mais caro, ainda, que ir de Nápoles à Ilha de Capri, na Itália. De Belém a Marajó, no Pará, uma viagem que tem o equivalente a 16 vezes o percurso, com ar-condicionado, não chega ao preço pago no Rio.

 

Os preços não são a única reclamação dos 97 mil passageiros diários das barcas. Atrasos e longas ­filas são problemas constantes. Só em março foram 4 dias de longas ­filas que chegavam a 100 metros. A segurança também apresenta problemas. Em fevereiro, a Agência Reguladora de Serviços Públicos Concedidos de Transportes Aquaviários, Ferroviários e Metroviários e de Rodovias do Estado do Rio de Janeiro (Agetransp) multou a CCR Barcas em R$574 mil devido a um acidente em que uma embarcação se chocou com a ponte de atracação do píer da Praça XV em novembro de 2011. Caso o serviço das barcas seja insatisfatório a ponto do usuário optar por outro meio de transporte, a mesma CCR Barcas receberá pela viagem do Rio a Niterói (ou vice-versa), uma vez que a concessionária também administra a Ponte Rio Niterói.

De acordo com Fábio Tergolino, Membro do Fórum Permanente de Mobilidade Urbana na Região Metropolitana do Rio de Janeiro, sediado no Clube de Engenharia, a batalha por transportes dignos está sendo travada em todo o país, mas a estreita ligação do executivo estadual e municipal com os executivos dos transportes torna a situação do Rio mais perversa.

O governo não cobra os milhões de reais em multas da agência reguladora que a CCR não paga há anos, incentiva a redução de custos da empresa com a redução da operação comercial no horário noturno. É a consagração da ilegalidade e no bojo disso vai a qualidade de vida do carioca.”, denuncia. Assessor para assuntos de transporte do vereador Reimont (PT/RJ), Tergolino acredita que a criação do Conselho Municipal de Mobilidade poderá influenciar no debate. A criação de um grupo executivo que estudará a implantação do conselho já está prevista no orçamento municipal desse ano.

Compras internacionais

A insatisfação dos usuários com a segurança, manutenção e preços se somam a uma questão muito cara ao Clube de Engenharia. No dia 15 de março o governador Sérgio Cabral assinou contrato com o estaleiro chinês Afai Southern Shipyard, da holding China Shipping Group, para a aquisição de sete novas barcas que farão o percurso Rio-Niterói. A promessa do secretário de Transportes, Julio Lopes, é dobrar a capacidade das barcas de 12,6 mil lugares para 24 mil lugares por hora. Segundo o governo do estado, outras duas barcas serão construídas pelo estaleiro cearense Inace. O total do investimento nas nove embarcações foi de R$ 273 milhões. Em reunião do Conselho Diretor do Clube de Engenharia, no dia 08 de abril, o conselheiro Vagner da Silva Oliveira apresentou proposta em regime de urgência sobre o assunto questionando a compra das barcas. Quando o governo do estado decidiu pela compra dos trens do metrô na China o Clube de Engenharia levantou o debate das compras públicas como ferramenta para fortalecer e fazer renascer setores especialmente prejudicados pela falta de incentivos. “Se essas sete embarcações fossem compradas aqui, quantos empregos quali­ficados seriam gerados? Enquanto empregamos na China, desempregamos aqui e isso mexe com toda a cadeia produtiva. Quem perde é a engenharia. Nosso minério de ferro, comprado barato aqui, vai voltar em forma de barcas lá da China”, explica o conselheiro.

Negócio lucrativo

O aumento da tarifa, justi­ficado pela Agetransp como o remédio para um “desequilíbrio econômico e ­ financeiro do contrato de concessão da Barcas S/A” – posteriormente comprada pela CCR – veio logo após a publicação de um balanço da empresa. Segundo o documento, as rodovias serão a prioridade do orçamento esse ano. A Nova Dutra levará R$261,2 milhões. Para as barcas, foram alocados R$30,2 milhões para obras de melhoria e equipamentos. O balanço também evidenciou um forte crescimento em receita líquida, fechando o ano de 2012 com R$ 5,197 bilhões, 15,2% acima do faturamento do ano anterior. Relatório da Secretaria Estadual de Transportes aponta que, segundo auditoria da fundação Coppetec, a CCR Barcas obteve um aumento de R$ 3,6 milhões em suas contas após o reajuste das tarifas em 2012.

Em recente manifestação contra o aumento dos preços, o deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL/RJ) criticou a postura do estado na questão. “Em conversa com o secretário de transporte, ele me disse que as barcas não funcionam de madrugada porque não dá lucro. Com um secretário que pensa assim, a CCR não precisa gastar com advogado de defesa. Seus interesses já estão protegidos pelo governo do estado”, denunciou. “Trata-se de um patrimônio público. O contrato de concessão não foi cumprido pela concessionária em diversos pontos e não há mais o que debater nesse sentido”, ­finalizou.

Matéria publicada na página 7 do jornal número 529 do Clube de Engenharia.

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