Inteligência artificial traz avanços mas também desperta desafios éticos

Encontros com Tecnologia debate o fenômeno da economia de dados e seus impactos técnicos, econômicos, políticos e sociais

Diversos recursos utilizados na interação entre os seres humanos e as máquinas já são resultado do desenvolvimento da chamada inteligência artificial. Essa tecnologia está presente já no dia a dia, através das indicações de filmes para serem vistos ou de músicas para se baixar nas plataformas de streaming, nos meios de pagamento e também no atendimento prestado pelas empresas. Ao mesmo tempo em que avança, ela suscita debates, dúvidas e controvérsia. Por isso, o Encontros com Tecnologia trouxe esse tema para ser discutido, com a participação de uma das maiores especialistas do país, a professora Dora Kaufman, professora da PUC-SP.

Os estudos sobre inteligência artificial tiveram início na década de 1950 e com eles também uma série de especulações sobre as implicações de seu uso. Frutíferas foram logo as criações no campo da ficção científica, através de romances e filmes de grande imaginação com relação à inteligência de humanoides e de máquinas em geral. Mas foi mais recentemente que a área apresentou maior desenvolvimento e aplicação. Na esteira da ficção produzida sobre o tema, há muitas ideias catastrofistas e por isso é tão importante separar a imaginação da realidade. Nesse sentido, o evento teve como título “Desmistificação da Inteligência Artificial: entre a idealização e a catástrofe”, para o público ter uma compreensão dos fatos sem sensacionalismos.

Segundo a palestrante, há atualmente um volume de dados muito maior para ser utilizado e o avanço da ciência de dados, criando modelos estatísticos com assertividade e capacidade de previsão de resultados muito mais acurada, levaram a um uso mais intensivo dessa tecnologia.

É possível, segundo a professora, já observar diversos benefícios para a sociedade desses avanços. Um deles é o diagnóstico de doenças por análise de exames por imagem. No agronegócio e na chamada indústria 4.0 também é cada vez mais fundamental os recursos de IA.

Mesmo que seja praticamente impossível se contrapor aos avanços tecnológicos, seus impactos não deixam de gerar preocupações. A palestrante abordou também a questão da substituição de tarefas humanas pelas máquinas e avalia que faz parte de um processo de evolução já verificado em outros períodos, mas que tende a ser mais prejudicial a trabalhadores menos qualificados. Essa observação é mais um alerta para o Brasil, que de fato precisa aprimorar seu sistema educacional e preparar as crianças e jovens para as mudanças que estão ocorrendo no mundo.

Por outro lado, o grande impacto econômico que essa tecnologia acarreta está na enorme concentração de renda e poder que provoca. Grandes empresas de tecnologia, que concentram o maior volume de dados, acabam se valorizando mais e a competição com elas é cada vez mais difícil.

Numa economia industrial, a matéria-prima principal é o petróleo e por isso a OPEP, regulando a demanda, controlava todos os preços da economia. Hoje temos cada vez mais uma economia de dados, onde a matéria-prima são essas informações. Por isso, no meu ponto de vista, há essa concentração de mercado que está acontecendo, que é algo inédito, com o poder muito forte de algumas poucas empresas. Tem a ver menos com a tecnologia delas e mais com o fato de possuírem plataformas que produzem a matéria-prima dos dados, tão forte nessa nova configuração da economia”, explicou a palestrante.

O assunto provocou muitos questionamentos por parte dos participantes. O presidente do Clube de Engenharia, Márcio Girão, também acompanhou o evento e levantou várias questões como o risco de a regulamentação prejudicar os desenvolvedores nacionais. Ele também lembrou o uso político dessa tecnologia, que em alguns países já estaria interferindo inclusive no processo democrático.

A professora se manifestou favoravelmente à regulamentação da inteligência artificial como forma de proteção da sociedade, mas sem prejudicar o avanço tecnológico. Para isso, seria necessário um amplo debate com a participação da sociedade civil e de especialistas na área, o que teria sido falho no caso do PL 21/2020, aprovado pela Câmara dos Deputados. Ela negou que a inteligência artificial tenha sido determinante para vitórias eleitorais com a de Donald Trump, nos Estados Unidos, em 2016.

Existe uma matriz de questões que transcende a inteligência artificial. Uma delas é o fato de a ultra direita não ter uma estrutura centralizada como nos partidos tradicionais. Isso facilita sua ação através das redes sociais e das plataformas digitais”, afirmou a professora.

Como em outras edições do Encontros com Tecnologia, o público se dividiu em grupos para debater o assunto e elaborar questões, enriquecendo a pauta. O evento, que é realizado normalmente na primeira quarta-feira de cada mês, cumpriu mais uma vez seu papel de proporcionar o networking temático e contribuir para o debate sobre tecnologia.

 

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