Por José Eduardo Moreira

A crise no setor elétrico brasileiro e, principalmente, o aumento na conta de energia do consumidor, são assuntos que têm sido discutidos com frequência na mídia. O problema que enfrentamos hoje não pode ser creditado apenas à natureza. Decisões políticas desacertadas, atrasos na implantação de obras estruturantes e fragilidades no cumprimento do planejamento muito contribuíram para este momento de dificuldades.

Somente a pouca chuva precipitada no ano de 2014 não justifica os aumentos nas contas dos consumidores, em grande parte devidos ao uso quase ininterrupto das usinas térmicas a plena capacidade desde outubro de 2012. O maior motivo é a falta de implantação dos empreendimentos hidrelétricos conforme o planejado.
Em 2012 tivemos uma afluência de 90 % da média histórica e, em 2013, foi verificada uma afluência hidrológica compatível com essa média. Quanto ao ano de 2014, apesar da baixa pluviosidade, no período histórico já ocorreram outros oito anos com índices pluviométricos inferiores.

As dificuldades que enfrentamos são, na verdade, consequência de algumas políticas equivocadas do governo federal e a conta dessas falhas ainda será cobrada ao longo dos próximos dois ou três anos. Podemos dizer que o não cumprimento dos Planos Decenais de Expansão da Geração e da Transmissão fez com que a situação chegasse a esse nível. Vejamos alguns pontos que nos levaram aos problemas que estamos enfrentando: 1- Atrasos nas licitações e nas implantações de usinas hidrelétricas, retardando o início da operação comercial destes empreendimentos; 2- descompasso entre os cronogramas de geração e transmissão de usinas hidrelétricas e de parques eólicos; 3- falta de incentivo à implantação de Pequenas Centrais Hidrelétricas - PCHs (usinas de até 30 megawatts); 4- incertezas ambientais e socioambientais quando da licitação das usinas hidrelétricas e das linhas de transmissão; 5- baixas tarifas nos leilões de usinas hidrelétricas, que não consideram os elevados riscos na implantação desses empreendimentos, o que tem afugentando o investidor privado nacional e internacional; 6 - falta de um programa mais agressivo voltado para o uso eficiente e racional da energia elétrica; 7 - falta de incentivo à geração distribuída e, por fim, 8 - falta de leilões regionais para as usinas eólicas e PCHs. Ao analisar cada um desses pontos, conseguimos ter uma visão um pouco mais ampla da situação.

Os prazos reais para a conclusão dos estudos de viabilidade e respectivos estudos ambientais, necessários para a realização de leilões para as concessões de usinas hidrelétricas e sistemas de transmissão, não são considerados corretamente nos planos de expansão, gerando, deste modo, atrasos nos processos de licitações.

Se tivéssemos construído as usinas e os sistemas de transmissão estipulados nos planos decenais do setor elétrico, não ficaríamos tão dependentes da operação das usinas térmicas e seu uso seria em menor escala, reduzindo assim os custos de geração. O caso mais recente de atraso em linha de transmissão é o da Usina Hidrelétrica Teles Pires, com 1.820 MW de potência, com três unidades já concluídas, mas sem a linha de transmissão para escoar a energia.

Outro problema para a construção de novas hidrelétricas, conforme já abordado acima, é o baixo teto das tarifas estipuladas nos leilões. Ele afugenta investidores privados e a tendência, caso não se reverta este quadro, é a de somente empresas estatais, que atualmente não têm disponibilidade financeira para implantar todos os novos empreendimentos necessários para o atendimento da demanda futura, participarem da expansão do setor.

Outro aspecto importante é a geração de energia a partir de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs), que poderia contribuir para a redução da crise, ainda que parcialmente, mas que o governo tem relegado a um plano secundário. As PCHs são próximas aos centros consumidores, com baixo impacto ambiental e menores prazos de construção. Há mais de 150 projetos prontos para serem construídos, dependendo apenas do governo colocar tarifas que viabilizem sua construção. Mas pouco tem sido feito.

Na questão das usinas eólicas, um problema a ser considerado é a localização dos novos parques geradores. O governo tem feito licitações privilegiando apenas áreas com melhores ventos, localizadas principalmente no Nordeste e no Rio Grande do Sul e, com isso, está concentrando a construção dessas unidades em poucos locais.
O Brasil tem dimensões continentais. Então, se pensarmos nos custos de transmissão e nas perdas de energia, desde as áreas de geração até o centro de consumo, localizado na região Sudeste, por exemplo, podemos dizer que seria mais econômico construir usinas em áreas com ventos um pouco inferiores, porém mais próximas aos grandes centros de carga.

Igual raciocínio se aplica à geração distribuída, em especial a produzida por fonte solar. Ou seja, produzir próximo ao ponto de consumo é mais econômico e causa menos impacto ambiental.Não podemos esquecer também a precipitada Medida Provisória 579 - lei 12.873 - que além de não reduzir a tarifa em 20 % de forma sustentável, aumentou ainda mais a insegurança do investidor privado.

Soluções para a crise energética existem. É necessário que o governo reveja algumas de suas ações para dar atratividade e segurança ao investidor privado. É preciso manter diversificada a matriz de energia, continuando como base a energia hidrelétrica, por ser de menor custo, renovável, e devido ao grande potencial existente ainda não explorado. Completaria a matriz energética as energias eólicas e térmicas.

Além disso, é preciso reforçar e estimular a geração distribuída e os programas de eficiência energética. Assim poderemos ter um futuro sem susto e um país mais sustentável.

José Eduardo Moreira, engenheiro civil, é diretor da Academia Nacional de Engenharia (ANE), ex-professor da UnB e presidente da PCE Engenharia.

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