Clube de Engenharia teme por momento da indústria brasileira e defende conteúdo local

Petronotícias | 04 de março de 2015

Entrevista com o Presidente do Clube de Engenharia, Francis Bogossian

Por Matheus Meyohas

No momento de crise pelo qual passa o país, a solução é abraçar a produção local e defender a engenharia brasileira. É o que sustenta o presidente do Clube de Engenharia, Francis Bogossian (foto). Mais do que isso, ele acredita que, a partir do momento em que a Petrobrás interrompe seu programa de investimentos por causa do andamento das investigações da Operação Lava-Jato, ela passa a prejudicar as empresas de engenharia brasileiras e toda a economia do País, com consequências diretas para os trabalhadores. Francis argumenta que o fim da participação das empresas brasileiras nos empreendimentos da Petrobrás não só tira o emprego da mão de obra técnica, como prejudica os outros setores da indústria, e pode fazer o Brasil voltar à situação dramática por que chegou a passar no passado, na chamada “década perdida”, quando quase não havia obras nacionais de infraestrutura e a carreira de engenharia passou por uma grande desvalorização.

Como o momento de instabilidade deve ser encarado pela Petrobrás?

Eu acho que a Petrobrás não pode prejudicar o seu programa em função dessa movimentação contra ela. Ela não pode se deixar afetar. Se houve irregularidade, os responsáveis devem ser punidos, mas não pode se punir a empresa, o que acaba prejudicando a nação brasileira e os empregados, não só da Petrobrás, mas das empresas de engenharia brasileiras que prestam serviços para o setor. As suspensões de contratação estão punindo indiretamente os empregados por erros dos empresários e diretores de empresas. As companhias estão demitindo mão de obra técnica, especializada ou não, e essas pessoas estão perdendo o emprego. Não estou defendendo culpados, mas a Petrobrás não pode ser prejudicada. Isso acaba punindo o povo brasileiro, de nível superior e médio. Ela é a maior fonte de emprego para a mão de obra dita especializada. Essa ideia que está sendo vendida, de fechar as empresas brasileiras, é inaceitável.

Esse embargo às empresas brasileiras citadas nas investigações deve gerar um aumento da participação de empresas estrangeiras nas obras nacionais?

As empresas de fora também estão envolvidas em problemas ilegais. É só uma questão de se informar. Desonestidade existe em todas as áreas. Se descobriram um erro, vamos tratar de provar, para que, assim que provados, sejam punidos, contratante ou contratados, Petrobrás ou outras empresas. Agora, fechar a porta da Petrobrás para elas? Tem grandes empresas, que originalmente eram de engenharia, que hoje são de oito serviços, mas que estão pensando em fechar o serviço de engenharia. Vamos acabar desempregando mais gente.

Qual é a principal falha da estatal ao tratar os casos da Operação Lava-Jato?

Não podemos levantar uma acusação e condenar sem provas. Isso é uma inversão. Numa reunião, o presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB e da Comissão da Verdade do Rio de Janeiro, Wadih Damous, disse que é algo irregular. Você não pode denunciar a pessoa e prender, e o Ministério Público do Estado não concorda com isso. E, na delação premiada, o cara vai falando para abrandar a pena, falando, falando, e aí? Eu não sou advogado, não sou a pessoa indicada. Cancelar contratos com a Petrobrás e ela deixar de contratar empresas evolvidas? Que ela faça através de licitações. Agora, deixar de convidar as empresas é como fechar o registro de alguém. A pessoa vai morrer por falta de água e vai acabar punindo o empregado, o engenheiro, o servente, que serão demitidos porque a Petrobrás declarou que ela não pode ser mais contratada. Não é uma situação político-partidária, de ser a favor de partido X ou Y. Sou a favor do povo brasileiro.

Qual é o principal temor dos engenheiros com uma possível alteração na regra de conteúdo local?

A grande preocupação nossa é com o desemprego da mão de obra técnica, especializada e dos serventes. A Petrobrás tá sendo prejudicada, prejudicando não só seus empregados, mas os empregados das empresas que são contratadas por ela. Que se façam os processos de contratação legalmente, que se averigue, mas chamem outras empresas brasileiras para fazer o serviço. Não tenho nada contra as estrangeiras, sou empresário, negocio com elas. Mas, antigamente, pela constituição, tinha que ter no mínimo 51% de capital para o Brasil. Hoje, empresas com capital 100% estrangeiro podem trabalhar.

Como você vê as perspectivas para o mercado de engenharia no futuro?

Está passando uma fase igual à da ditadura, quando paralisaram o programa de rodovias. Lembro que foi uma tristeza, passamos três décadas com programas nacionais de obras paralisados. Hoje, nós estamos chegando a esse ponto de novo. Se não nos mexermos, vamos paralisar a Petrobrás e ficar à míngua. Vamos acabar vendendo ela para o mercado estrangeiro. Vamos levar de novo 30 anos para novos investimentos. Eu trabalhei numa escola de engenharia que diminuiu o número de alunos de 5 mil para mil. Isso vai voltar a acontecer. O cara vai pegar um táxi, vai trabalhar numa lanchonete espremendo fruta. Vai acabar gastando três salários mínimos para estudar em faculdade particular e não vai ter retorno. Porque desenvolvimento não pode prescindir da engenharia e vice-versa. E não estou defendendo só o emprego do engenheiro, mas também o do economista, o técnico de nível médio, o desenhista, o geógrafo etc. Além disso, ainda se perde a mão de obra não especializada. Muita gente começa como servente, e as boas empresas perdem esse serviço. Na minha empresa, tive gente que se formou trabalhando por lá. As empresas brasileiras ajudam os seus funcionários. E mesmo que não estude, vira pedreiro, vira eletricista, são cursos mais baratos, que aprendem com funcionários. Se o desenvolvimento parar, nós vamos desempregar todos.

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