Especialistas criticam os piscinões e propõem o túnel extravasor

Os alagamentos na Praça da Bandeira – assim como na Av. 28 de Setembro, Rua Mariz e Barros, São Clemente e Jóquei – existem desde o início do século passado.  As “chuvaradas de verão”. já foram até  retratadas em textos literários de Lima Barreto.Um triste espetáculo que o Rio insiste em manter, que voltou a se repetir no último sábado, dia 12.  

Nos debates que vêm travando com a sociedade e os gestores públicos, o Clube de Engenharia tem dado sua firme contribuição ao insistir na construção do Túnel Extravasor como solução técnica das mais eficazes, embora não seja a única.  

Em 2011, na publicação Engenharia em Revista, do Clube de Engenharia, o engenheiro civil e conselheiro Luiz Carneiro, já defendia que além do projeto do Túnel Extravasor contemplar tanto a Zona Norte quanto a Zona Sul da cidade, a obra trará menos transtornos à sociedade. Por se tratar de uma obra subterrânea, os impactos sociais e ambientais serão muito menores do que os provocados pelos piscinões. A obra do túnel não afetará o trânsito e não promoverá remoções”, alertou o então diretor do Clube de Engenharia.

Os alertas continuam e, gradativamente, o debate avança. Em reportagem do jornal O Globo, assinada por Luiz Ernesto Magalhães, com a colaboração de Natália Boere, publicada nesta terça-feira, 15 de março, entre outros especialistas consultados, o conselheiro Stelberto Soares aponta o que vem observando há algum tempo: “em chuvas fortes, os piscinões podem reter lixo carregado pela enxurrada, obstruindo o sistema de bombas empregado para o armazenamento:”

Leia a reportagem na íntegra:

 

O Globo – 16.03.16

 

Após temporal, especialistas questionam eficácia de piscinões

Com capacidade para 76 milhões de litros, reservatórios encheram em pouco mais de uma hora


Por Luiz Ernesto Magalhães (Colaborou: Natália Boere)

RIO - As águas de março invadiram a Praça da Bandeira na noite de sábado passado, inundando de dúvidas especialistas e moradores quanto à eficácia dos piscinões — um terceiro ainda está em construção — que a prefeitura inaugurou justamente para evitar as enchentes, problema que se repete há décadas. Com capacidade para armazenar 76 milhões de litros, os reservatórios da Praça da Bandeira (18 milhões) e da Praça Niterói (58 milhões), que estão em operação, encheram em pouco mais de um hora durante o temporal. A prefeitura nega que esses piscinões tenham apresentado qualquer problema técnico ou operacional. As dúvidas, no entanto, são reforçadas pelo fato de a Secretaria de Conservação alegar que, na véspera da tempestade, terminara uma revisão em todo o sistema de drenagem da Grande Tijuca. A prefeitura argumenta que as chuvas foram intensas demais e que esses reservatórios fazem parte de um sistema integrado de controle de inundações que será concluído até o fim de junho.

Especialistas concordam em parte com o argumento de que o sistema ainda funciona de forma parcial, mas alertam que outros fatores podem ter contribuído para os transtornos de sábado. Diretor do Clube de Engenharia, Stelberto Soares observa que, em chuvas fortes, os piscinões podem reter lixo carregado pela enxurrada, obstruindo o sistema de bombas empregado para o armazenamento:

— O acúmulo de lixo no piscinão da Praça da Bandeira já havia ocorrido em outro temporal na semana anterior. Esse acúmulo de sedimentos é uma dificuldade na operação de qualquer reservatório.

Soares observou que, na prática, o reservatório da Praça Niterói, inaugurado no fim do ano passado, teve uma atuação limitada, porque foi projetado para operar integrado com o piscinão da Praça Varnhagen (43 milhões de litros), que ainda está em obras.

O coordenador do Departamento de Hidrologia da Coppe, Paulo Canedo, concorda que a manutenção das estruturas limpas pode ser um desafio:

— Operar um sistema desses é um desafio. Mas, como ele ainda não está pronto, é difícil afirmar que de fato houve problemas na limpeza e se o uso desses reservatórios dará certo.

Sábado passado, o sinal vermelho no piscinão da Praça da Bandeira surgiu quando 70% da sua capacidade foi atingida, às 20h18m — cerca de uma hora após o início do temporal. Como o Rio Joana transbordou e não tinha como a água escoar, o limite do piscinão foi atingido em poucos minutos. Nesta segunda-feira a prefeitura não conseguiu informar o tempo exato.

GARAGEM INUNDA E DEIXA CARROS SUBMERSOS

As obras para implantar os piscinões deveriam ter sido concluídas há três anos. No entanto, mudanças no projeto e problemas com empreiteiras atrasaram o serviço. Com as alterações, os reservatórios, juntos, terão apenas 42,3% da capacidade original prevista (281 milhões de litros), como O GLOBO revelou em outubro do ano passado.

O prefeito Eduardo Paes considera que a situação vai melhorar com a conclusão das obras. Ele cita como a intervenção mais importante a implantação de um túnel extravasor no Rio Joana, que vai desviar, diretamente para a Baía de Guanabara, a água em excesso dos rios Comprido, Maracanã, Papa-Couve e Trapicheiros.

— Essa obra do túnel é complexa. Neste momento, a gente está no trecho mais difícil, porque a tubulação cruza o bairro de São Cristóvão, que tem várias estruturas tombadas. Imagine a complexidade de passar essa tubulação por baixo da Quinta da Boa Vista e da Avenida Brasil — disse Paes.

Para quem, mais uma vez, sofreu prejuízos com as enchentes na Grande Tijuca, o momento é de dúvida sobre a eficácia do sistema. É o caso dos moradores de um prédio na Rua Felisberto de Menezes, na Praça da Bandeira, cuja garagem alagou, deixando submersos pelo menos dez carros e duas motos. Um dos veículos pertence à psicóloga Teresa Amendola, que viu um pesadelo se repetir. Em temporais de 1998 e 2010, ela também teve prejuízos com carros na garagem inundada.

— Até agora, o piscinão da Praça da Bandeira só serviu para evitar alagamentos durante chuvas menores. Não passou no teste — reprovou Teresa.

As chuvas de sábado deixaram cinco mortos, incluindo duas vitimas de deslizamentos no Morro da Chácara do Céu, no Leblon. A quinta vítima foi identificada ontem: Edson Conceição, de 39 anos, era diácono da Catedral Presbiteriana do Rio e será enterrado hoje, às 10h, no Cemitério do Catumbi. Ele morreu eletrocutado ao receber uma descarga elétrica quando caminhava na Rua do Passeio, no Centro. Nascido com hidrocefalia, Edson foi entregue para adoção quando ainda era bebê. Ele era solteiro e morava com a mãe adotiva no Flamengo.

CIDADE JÁ REGISTROU TEMPORAIS MAIS FORTES

O temporal que caiu na cidade pode ter sido forte, mas não aparecia ontem no ranking do Sistema Alerta Rio que lista as dez maiores precipitações na capital desde 1997. Segundo dados do site do órgão, as maiores chuvas da Grande Tijuca registradas no intervalo de uma hora na estação pluviométrica da Tijuca/Muda foram de 99,6 milímetros, em 26 de abril de 2011, e de 92,2 milímetros, em 6 de dezembro de 2013. Na estação do Alto da Boa Vista, houve um registro de 87,2 milímetros também no dia 26 de abril de 2011. No período de 24 horas, já chegou a 286 milímetros, nos mesmos mês e ano.

Em nota, a Secretaria municipal de Saneamento e Recursos Hídricos alegou que as chuvas do último sábado teriam sido as maiores registradas na Grande Tijuca nos últimos 50 anos. A pasta, no entanto, adotou um critério diferente do usado pelo Alerta Rio, que serve de orientação para todos os órgãos municipais se planejarem para enfrentar os transtornos causados pelas chuvas. A secretaria divulgou apenas o volume de chuvas acumulado no período de duas horas, sem indicar qual a precipitação por faixa de horário. Foram 123 milímetros na estação Tijuca/Muda e 165 milímetros na do Alto da Boa Vista.

 

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