Nos últimos anos, o dia 8 de março, Dia Internacional da Mulher, vem perdendo bastante o caráter festivo e recuperando o seu verdadeiro sentido: a luta das mulheres pela igualdade de oportunidades e respeito em um mundo estruturalmente machista. Na Engenharia, o reflexo dessa mudança pode ser comprovado nas salas das universidades, onde elas estão cada vez mais presentes, conquistando espaços e destaques. A igualdade no mercado de trabalho, no entanto, ainda não é uma realidade.
Segundo dados do sistema Confea/Crea, embora haja avanço na participação das mulheres nas entidades de classe e no mercado, apenas 15% dos profissionais registrados são mulheres. Entre os Creas, em 2018, a diferença é gritante. Em São Paulo são 329.337 homens e 45.099 mulheres. No Crea-RJ, 203.795 inscritos são homens, contra 28.763 mulheres. Em nenhum Crea o número de mulheres supera em pelo menos 30% o de homens.
Para mudar esse panorama, foi criado em 2018 o Programa Mulher, que tem como objetivo contribuir para que o país alcance a igualdade de gênero e empodere mulheres e meninas, uma das metas do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da agenda 2030 da Organização das Nações Unidas.
Problemas estruturais
Esse momento de avanços, ainda longe da equidade, se manifesta no cotidiano de engenheiras nos canteiros de obras que, claramente, não são montados levando em consideração a presença delas nas equipes de obras. “Já passei por dificuldades em obras de túneis nas quais não havia botas do meu tamanho, nem banheiro feminino. Eu tentava andar pelo canteiro e ficava presa na lama”, conta Daniela Garroux, tesoureira do Comitê Brasileiro de Túneis CBT e consultora da TunGeo. Ela e outras sete mulheres da área tecnológica fizeram uma live no início de abril para trocar experiências e impressões sobre a participação da mulher na engenharia, geologia, geotecnia etc. A organização foi do próprio CBT, da Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica (ABMS).
Diferentes gerações se encontraram no debate virtual. Entre as profissionais mais novas, a percepção é de respeito e normalidade, principalmente por já terem entrado no mercado sob lideranças femininas pioneiras. Paula Maia, coordenadora de anteprojeto civil e traçado do Metrô de São Paulo destaca isso. “Quando entrei no Metrô tive muitas chefes mulheres”. Magali Gurgueira, geóloga projetista e consultora da MaisGeo/CJC Engenharia, também lembra a importância dessas desbravadoras. “Não faço parte da geração pioneira. Fui liderada por várias mulheres e aprendi muito com elas. Isso sempre fez parte do meu convívio. Já faço parte de uma geração que a presença feminina sempre foi muito forte, inclusive Na área de túnel. Não somos maioria, mas acredito que temos um cenário com presença feminina crescente e relevante nas obras subterrâneas”, comemora a geóloga.
Já as profissionais da “geração pioneira” viveram outra realidade. E não faz muito tempo. “Quando estava no doutorado, participei de um congresso internacional em 1999 em Campos do Jordão no qual eu era a única mulher levando um trabalho para apresentar. Em São Paulo há uma dinâmica maior entre nós profissionais, mas na mineração é um pouco diferente. Muitas vezes eu entro em reuniões nas quais sou a única mulher. Algumas colegas engenheiras muito boas trabalham comigo, mas ainda é bem menos do que vemos em São Paulo”, conta.
“Um subordinado me parabenizou pelo cargo de chefia enfatizando ‘principalmente por você ser mulher’’,
contou a engenheira Renata Rocha, que destacou, ainda, que “na pandemia, profissionais competentíssimas tiveram que ficar em casa com os filhos enquanto seus maridos seguiram trabalhando”.
Há muito caminho a percorrer, mas elas estão lá, decididas a conquistar o que ainda falta para instituir a igualdade de gêneros e entre os profissionais das engenharias e correlatas.