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Polêmica do X esconde reais interesses de Musk no Brasil

Polêmica do X esconde reais interesses de Musk no Brasil

Elon Musk. Crédito: James Duncan Davidson/Reprodução
Polêmica do X esconde reais interesses de Musk no Brasil
Indústria Química Brasileira

Empresário tenta monopolizar internet via satélite, segmento em que sua empresa já é líder

A recente queda-de-braço entre o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e o empresário Elon Musk expõe disputas que vão muito além das postagens feitas na rede social X (antigo Twitter). A controvérsia trouxe à tona os intrincados interesses desse empreendedor nascido na África do Sul e naturalizado americano, que controla, entre diversas empresas, a SpaceX e sua subsidiária de internet via satélite Starlink. Para muitos analistas, a mídia social teria como principal função ser ponta de lança das estratégias comerciais da holding, influindo politicamente no país. O objetivo seria criar um monopólio dessa tecnologia disruptiva, o que traria de quebra vantagens geopolíticas aos Estados Unidos.

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Alexandre de Moraes, ministro do STF. Crédito: Agência Senado

A trama envolvimento da rede social X e o STF já vem de longe. A plataforma aquirida por Musk se recusa a cumprir ordens de suspensão de perfis considerados anti-democráticos e por isso fechou o escritório no país, onde também se negava a manter um representante legal. O ápice da briga foi a suspensão do X no Brasil. Sob a ameaça de ter suas contas bloqueadas e até de perder a outorga no país, a Starlink, que chegou a ir contra a medida, desistiu de manter a rede social no ar e cumpriu a ordem já acatada por outras operadoras.

Assim como no Brasil, Musk vem usando uma suposta defesa da liberdade de expressão para justificar seus posicionamentos. Ele vem enfrentando também o governo australiano, que ele chamou de “fascista”. No país da Oceania, há um projeto para multar as redes sociais que não combaterem a desinformação e as autoridades não se deixaram intimidar com os comentários. Vários ministros o criticaram, sendo que o ministro de Serviços Governamentais, Bill Shorten, chegou a ironizar o empresário, dizendo que: “Elon Musk teve mais posições sobre liberdade de expressão do que o Kama Sutra”. 

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Então ministro das Comunicações, Fábio Faria durante evento de Conectividade e Proteção da Amazônia com Elon Musk e o ex-presidente Jair Bolsonaro. Crédito: Cleverson Oliveira/Mcom

Ao mesmo tempo em que posa de liberal por um lado, por outro usa sua força para influir no processo político, sem pudores, o que não deixa de ser útil para sua estratégia empresarial. Nas eleições para a Casa Branca deste ano, apoia ostensivamente o candidato republicado Donald Trump. Sinal dessa relação umbilical são as invectivas do representante do partido na Comissão Federal de Comunicações (FCC) dos Estados Unidos, o equivalente à ANATEL no Brasil. O comissário Brendan Carr chegou a oficiar a agência brasileira, com carta criticando o bloqueio do X

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Lançamento da SpaceX Falcon 9 CRS-19 no Cape Canaveral

Mas nada indica que caso a adversária democrata Kamala Harris vença as eleições Musk ficará necessariamente em maus lençóis. Tanto que a Embaixada dos Estados Unidos no Brasil, mesmo sob o governo Biden, vem acompanhando a questão envolvendo a X de perto e até divulgou uma nota oficial criticando as medidas do Supremo, apesar de os americanos terem banido o TikTok de seu território. Mais do que se preocupar com as tretas e confusões que acontecem no antigo Twitter, os americanos estão mirando seus interesses geopolíticos. O sucesso de Musk garante o domínio antecipado das transmissões de dados via satélite de baixa órbita, uma tecnologia disruptiva que vem ganhando rapidamente adesões no Brasil.

Os interesses privados e do Estado americano se confundem por causa da corrida tecnológica em torno da liderança do domínio do espaço, o que envolve outros países. Durante o governo Bolsonaro, a Starlink conseguiu autorização para operar com até 4.408 satélites sobre o território brasileiro. Isso fez com que seus preços e a qualidade de transmissão a tornassem muito competitiva nesse mercado. Tanto que em pouco tempo a operadora conseguiu se tornar líder no segmento de internet via satélite no Brasil, com mais de 200 mil clientes, a maioria deles na região Amazônica. Hoje até comunidades indígenas e quilombolas dependem da empresa para ter acesso à rede e entidades do setor público, do Poder Judiciário, Executivo, incluindo as Forças Armadas, estão atreladas ao serviço de Musk. 

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Internet via satélite foi instalada na região do Sururucu. Crédito: Urihi Associação/Divulgação

Sua participação total no mercado ainda é considerada pequena, se comparada com as grandes operadoras de telefonia, mas cresce rápido. Recentemente, a empresa solicitou à ANATEL autorização para colocar em operação mais 7,5 mil satélites no Brasil. Todo esse aparato precisa de estações terrestres (gateways) para a retransmissão de dados para os usuários. No entanto, durante um congresso nos Estados Unidos em março, foi antecipado que a empresa pretende adotar a tecnologia de conectividade a laser, o que praticamente dispensaria os equipamentos em terra.

Esse domínio que Musk vai exercendo no Brasil nessa tecnologia preocupa, tendo em vista sua aversão a cumprir ordens judiciais e à possível dificuldade de controle, fiscalização e regulação de seu serviço, principalmente depois que congestionar o espaço aéreo brasileiro e não precisar mais da estrutura terrestre. A Coalizão Direitos na Rede (CDR) divulgou um documento em que cobra do Ministério das Comunicações medidas que assegurem a soberania tecnológica e a garantia de inclusão digital no Brasil.

“A situação é alarmante: o Brasil não possui uma política nacional articulada de inclusão digital, há uma lacuna de oferta de conectividade em diversos territórios do País e uma dependência tecnológica de empresas estrangeiras, constituindo uma barreira à garantia dos direitos fundamentais”, dizem as entidades na carta enviada ao MCom. 

O texto também alerta para a vulnerabilidade de entes governamentais estratégicos. “Órgãos públicos do governo federal como o Exército, a Marinha, os ministérios da saúde e educação, além da Petrobras, FUNAI e UFAM (Universidade Federal do Amazonas), que também fazem uso da tecnologia oferecida pela Starlink, acabam expostos e suscetíveis às políticas da empresa”, diz a CDR.

Numa recente audiência pública no Senado, a diretora de desenvolvimento institucional do Nupef, Oona Castro, alertou para a discrepância entre as obrigações das operadoras que atuam no Brasil e o que é cobrado da Starlink. Ela também questionou os critérios usados para as outorgas da empresa de Musk.  

“Em que medida o governo apresentou parâmetros de obrigações para a Starlink? Outras operadoras possuem responsabilidades perante o Estado brasileiro, como o de ampliar infraestrutura, prover serviços de qualidade, etc”, disse a representante do Nupef, na audiência pública.

No mesmo debate, Paulo Rená da Silva Santarém, pesquisador da Universidade de Brasília (UnB), defendeu a tomada de medidas em prol da soberania tecnológica brasileira e uma revisão na regulação dos serviços de telecomunicações para se ter maior controle sobre a internet via satélite.  

“Hoje, o Brasil ficaria impotente se a Starlink mudasse qualquer coisa no seu funcionamento. Necessitaríamos fomentar uma estrutura pública, para termos autonomia”, disse Santarém.

Enquanto até as Forças Armadas brasileiras ficam reféns da tecnologia de Musk, outros países investem em redes próprias de internet via satélite. Em agosto, a  estatal chinesa Shanghai Spacecom (SSST) anunciou o envio ao espaço de 18 satélites de baixa órbita. Esse é apenas o início de um ambicioso projeto do país asiático, que conta também com a estatal China Satellite Network como operadora no segmento. Ao todo, os chineses pretendem lançar nos próximos anos mais de 40 mil satélites para a conexão global com celulares, Internet das Coisas e computadores.

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Na Índia, onde a empresa de Musk sequer conseguiu autorização para operar, os gigantes locais da tecnologia investem pesado e correm contra o tempo para estabelecer rede própria de satélites. Além da tendência de inércia de clientes que aderem a uma operadora de telecomunicação, o que acarreta fidelidade, a primazia nesse novo campo é considerada estratégica tendo em vista a dificuldade de quem chegar posteriormente terá de obter autorizações, mediante o risco de interferências nas frequências depois da ocupação do espaço aéreo. 

Com milhares de satélites de órbita, o problema do lixo espacial deve se agravar, o que também já deveria estar sendo debatido no Brasil e no mundo. Portanto, são muitos os aspectos que obrigam o país a adotar uma política de maior soberania sobre o setor. São tão graves que tornam a preocupação com o funcionamento da X no país apenas uma cortina de fumaça. 

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