Ex-presidente da Nuclep militou contra a ditadura militar e esteve entre os presos políticos soltos em troca da libertação de embaixador suíço, em 1971
O período da ditadura militar, que teve início em 1964 e durou cerca de 20 anos, foi marcado pelo autoritarismo e a adoção de um modelo econômico que aprofundou as desigualdades sociais. No entanto, foi também uma época que revelou a bravura e a sensibilidade de homens e mulheres, que não só lutaram por democracia como sonharam com um país mais justo. Entre os jovens que batalharam no front dessas lutas, esteve Jaime Wallwitz Cardoso, o Jaimão, que viveu no exílio, retornou com a Anistia, e chegou a ocupar por 13 anos a presidência da Nuclep. Com sua despedida da vida no último domingo (26/11), o Brasil perde um dos mais combativos militantes pelas liberdades políticas e por desenvolvimento e justiça social.
Jaime Cardoso militou na organização de esquerda Ação Popular (AP), ainda como estudante secundarista, grupo com o qual rompeu em 1969. No mesmo ano, ingressou na VAR-Palmares, e acabou preso. Atuou com outros guerrilheiros famosos como Carlos Marighella, Carlos Lamarca, a ex-presidente Dilma Rousseff, José Dirceu, entre outros.
O grupo realizou o sequestro do embaixador suíço Giovanni Enrico Bucher e conseguiu a libertação de 70 integrantes, o que beneficiou Jaimão e talvez o tenha salvado de consequências trágicas. O preço pago foi o exílio no Chile, a partir de janeiro de 1971.
Com o golpe militar em 1973 que resultou no assassinato do presidente Salvador Allende, Jaime Cardoso buscou abrigo na Suécia, onde estudou economia na Universidade de Estocolmo. Retornou ao Brasil em 1979, com a abertura política do governo do general Figueiredo e a instituição da Lei da Anistia.
Jaime foi secretário geral do Partido Socialista Brasileiro (PSB) e ocupou cargos na administração pública. Foi Secretário Estadual de Trabalho do Rio no governo Rosinha e Secretário de Governo na gestão Garotinho.
Ocupou a presidência da Nuclep por 13 anos, nos governos Lula e Dilma Rousseff, onde implementou uma gestão de retomada do papel da empresa como participante de projetos nacionais de grande envergadura, voltados para a área de petróleo e energia nuclear.
“Quando o conheci, na altura dos anos 1980 – campanha das Diretas-Já – Jaime Cardoso já carregava uma história de resistente, iniciada ainda nos bancos escolares, quando conheceu a prisão e a tortura, que deixariam marcas insuperáveis em seu corpo e em sua alma. Expatriado pela ditadura militar, continuou a luta no Chile de Allende e foi sofrer a dor dos presos no Estádio Nacional, em Santiago (1973), e, finalmente, o exilio na Suécia. Era, a partir daí, o que seria até o último dia, um sobrevivente, ou, sempre um guerreiro, como prefere Lilian, sua grande companheira. No regresso ao Brasil seria nosso companheiro, meu, de Jamil Haddad e de Antônio Houaiss na tentativa de construção, no país redemocratizado, de um partido socialista. Fracassamos mas não nos arrependemos, ele ainda me dizia no leito de morte, quando nos despedimos. O Padre Antônio Vieira, nos ensina no seu sermão da terceira dominga do advento: “O homem é as suas ações”. Ações de Jaime fizeram dele um orgulho para seus amigos”, declarou o amigo e ex-presidente do PSB Roberto Amaral.
O ex-presidente da Eletronuclear Almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva também lembra com carinho de Jaime Cardoso. “Ao assumir o cargo de Diretor Presidente da Eletronuclear procurei o Jaime, então Presidente da NUCLEP, que foi muito colaborativo aceitando a indicação de um gerente e de um engenheiro mecânico que haviam trabalhado no Programa de Desenvolvimento da Propulsão Nuclear para submarino. O Jaime foi sem dúvida um grande brasileiro sempre disposto a resolver problemas de Angra 1 da maneira mais racional. Os dois geradores de vapor que poucos locais no mundo fabricam foram fabricados com sucesso e instalados. Este era um dos problemas de Angra 1, apelidada pela imprensa de “Usina Nuclear Vagalume”. A partir de 2009, a Usina Angra 1 passou a figurar entre as usinas de melhor desempenho no planeta. Jaime e eu nos tornamos amigos mesmo ele sendo um Vascaíno inveterado e eu Flamenguista desde garoto!”, contou Almirante Othon.
Além de torcedor fanático pelo Vasco, Jaime Cardoso também tinha paixão pela poesia. Ele lutava há três anos contra o câncer e não resistiu no último domingo. Deixou a mulher Lilian e dois filhos, Iuri e Alex.
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