Os muitos erros e os poucos acertos da privatização do gás natural no Brasil

“O governo precisa cobrar das concessionárias do serviço público a ampliação da sua rede de atendimento, para levar o gás canalizado a todos os municípios do Rio de Janeiro. Não foram criados mecanismos que obrigassem as concessionárias a realizar investimentos e expansão da rede. Com isso, elas se concentraram no filé mignon, apostando principalmente nos grandes clientes. Isso exige um grau de investimento baixo e, em contrapartida, uma alta taxa de lucro”, afirma o secretário da Divisão Técnica de Energia do Clube de Engenharia, Antônio Gerson Ferreira de Carvalho, autor do livro recém-lançado Gás Natural no Brasil, uma História de Muitos Erros e Poucos Acertos.

Sem cobranças ou mesmo fiscalização dos serviços, as concessionárias sequer ampliaram a rede de gasodutos. Hoje, são poucos os municípios que passaram a receber gás natural após a privatização do setor em 1997 (já eram atendidos Rio de Janeiro, São João de Meriti, Nova Iguaçu, Queimados, Belford Roxo, Duque de Caxias, Magé, São Gonçalo, Volta Redonda, Barra Mansa e Resende). No caso das três últimas cidades, a Petrobras repassou para as concessionárias os gasodutos e os fornecimentos que fazia diretamente para grandes empresas do cinturão industrial do Rio de Janeiro.
 
Gerson conta no livro – publicação do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge-RJ) – que no dia seguinte à privatização, os dirigentes do grupo controlador das concessionárias prometeram dobrar o número de consumidores de gás canalizado. Prometeram, ainda, renovar e ampliar a rede de gasodutos do Rio de Janeiro. Davam para isso um prazo entre oito e dez anos. Porém, balanço feito no fim de 2015 aponta que mais de 18 anos depois da privatização só ampliaram de pouco mais de 558 mil para 930 mil os consumidores de gás canalizado em todo o estado.

Explosões e mortes
“Tarifas elevadas, insuficiente expansão das canalizações, e a má qualidade dos serviços oferecidos estão entre os principais motivos para esse grande fracasso”, constata.

Com 35 anos de experiência no setor, Gerson avalia que improviso e a falta de planejamento são as principais características da política energética brasileira nos últimos 25 anos. No caso do gás natural, os erros acarretaram graves consequências econômicas e sociais: energia cara, serviços de péssima qualidade, acidentes, explosões e mortes.
 
“No fim da década de 1990 e início dos anos 2000, os bueiros do Rio tornaram-se explosivos. E ainda são”, disse Gerson. Difícil esquecer os problemas enfrentados pela população do Rio de Janeiro logo após as privatizações da Light, CERJ e CEG, que motivaram iniciativas de diversos parceiros (Ilumina, Clube de Engenharia e o Senge/RJ) na tentativa da criação de uma Agência de Fiscalização Independente do Serviço Público – AFISP, com o objetivo de suprir a inoperância das Agências Reguladoras criadas.


Desmonte técnico
Ex-superintendente de Gás da Secretaria de Estado de Energia, Indústria Naval e Petróleo do Rio de Janeiro e ex-presidente do Senge-RJ, Gerson disse que escreveu o livro, entre outros motivos, para registrar o resultado do desmonte de equipes técnicas inteiras dos órgãos e empresas responsáveis pelo gás natural no Brasil.
 
Em sua opinião, a indústria de gás natural foi a mais prejudicada com as privatizações ocorridas na década de 1990, embora, na época, o governo tenha feito uma ruidosa campanha sobre os benefícios da venda da companhia de gás canalizado para a iniciativa privada. “Eles alardearam que o serviço ia melhorar, que a tarifa ia cair. Conversa fiada. De concreto, o que temos hoje é a deterioração dos serviços e a má conservação das redes”, afirmou. 
 
Apesar dos erros apontados Gerson acredita que o setor deve continuar a sua trajetória de crescimento. E o motivo é de conhecimento amplo e irrestrito: as extraordinárias reservas brasileiras de petróleo e gás natural descobertas no Pré-Sal. O autor só espera que a história “siga de forma menos errática e em benefício da maioria da população brasileira”.

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