No último dia 26, a presidente do BNDES, Maria Silvia Bastos Marques, anunciou a sua renúncia, encerrando um período de quase um ano no comando da instituição. O período em que a presidente esteve à frente do Banco foi marcado por muitas contradições, que a levaram a uma situação insustentável e que culminou no seu pedido de demissão.
A breve passagem de Maria Silvia pelo BNDES
Por Thiago Mitidieri
Presidente da Associação dos Funcionários do BNDES (AFBNDES)
A primeira contradição está relacionada ao seu alinhamento incondicional ao Ministério da Fazenda e ao Banco Central que, atualmente, sustentam a tese de que o BNDES é uma anomalia para o país. A liquidação antecipada, em dezembro de 2016, de parte dos empréstimos do Tesouro ao BNDES, no valor de R$ 100 bilhões, e a MP 777, que extingue a TJLP e cria a TLP, atrelada à taxa de mercado (NTN-B 5 anos), são dois exemplos dessa contradição.
A segunda contradição tem relação com a ausência de uma visão clara e consistente sobre o papel de um Banco de Desenvolvimento, em geral, e do BNDES, em particular; e com a falta de racionalização ou planejamento que permitisse ao Banco contribuir para a recuperação da economia em crise, com desemprego alto e crescente.
A terceira contradição diz respeito à sua posição diante da campanha de destruição da reputação do BNDES e dos seus funcionários. Diante do turbilhão de acusações de órgãos de controle, da mídia e do próprio governo, a presidente Maria Silvia se colocou numa situação de conflito de interesses entre a sua posição de presidente do BNDES e de membro do governo Temer.
Nesse sentido, a presidente mantinha um discurso ambíguo. “Para dentro”, reconhecia a ética e a competência do corpo técnico; “para fora”, não podia confirmar o discurso interno para não “confrontar” a orientação do Planalto de colocar o BNDES como a “bola da vez”, alimentando a guerra política que assola o país.
Com a Operação Bullish da Policia Federal, deflagrada em 12 de maio, que culminou com a condução coercitiva de 37 funcionários do BNDES, incluindo uma grávida de 39 semanas, a presidente Maria Silvia, pressionada pelo corpo funcional – mesmo que de forma tímida e protocolar –, saiu em defesa da instituição e dos funcionários, o que pode ter desagradado o Planalto.
A enorme fragilização do governo Temer, com a perda significativa de apoio político, a forte insatisfação do setor produtivo com a atuação do Banco, a enorme insegurança profissional do corpo funcional benedense após a Operação Bullish e a desconfiança do Planalto que esperava de Maria Silvia uma atitude que reforçasse o estado de suspeição sobre o BNDES colocaram a ex-presidente numa armadilha de contradições insuperável.
Importante destacar que a posição do corpo técnico do BNDES em oposição à proposta de reorganização societária da JBS, que previa a transferência da propriedade de ativos que representam aproximadamente 85% da geração do caixa operacional da empresa para uma companhia estrangeira e que implicaria na sua desnacionalização, protegeu a presidente Maria Silvia da tentativa de influência política do governo Temer, conforme delação do próprio Joesley Batista.
Maria Silvia, infelizmente, não vai deixar saudade. Esperamos que o novo presidente do BNDES não seja vítima da mesma armadilha que inviabilizou a permanência dela à frente da instituição.
A responsabilidade do novo presidente do BNDES é imensa, na medida em que estamos inseridos na pior crise econômica da historia brasileira, com taxa de desemprego recorde; e num momento em que as atividades do BNDES, enquanto Banco de Desenvolvimento, estão sendo criminalizadas pelos órgãos de controle, deixando o corpo técnico do Banco numa situação de grande insegurança profissional e com o risco de paralisação.
É fundamental que o novo presidente afirme o papel de Banco de Desenvolvimento do BNDES e valorize o seu corpo técnico, projetando “o BNDES do futuro” face aos desafios nacionais e à necessidade de o Banco dar uma condizente resposta à crise, mostrando para a sociedade que o BNDES não é parte do problema, mas sim da solução.
Aos colegas do Banco uma mensagem: mais do que nunca, o momento é de união. Pois apenas unidos teremos condições de resistir à avalanche que tenta destruir a reputação do BNDES e dos seus funcionários. Vamos nos manter firmes porque temos consciência de que o BNDES é muito maior do que tudo isso; os desafios nacionais são muito grandes e o país precisa do nosso trabalho e dedicação.