No próximo dia 27 de setembro o país pode retroceder no que seria uma grande conquista na área das telecomunicações e da segurança nacional. Está marcado para esse dia o leilão de 57% da capacidade civil total disponível no Satélite Geoestacionário de Defesa e Comunicações (SGDC), em dois lotes, um com 35% da capacidade e outro com 22%. A importância do primeiro satélite nacional, após a privatização ocorrida no setor, quando todos os satélites nacionais passaram para as mãos de empresas estrangeiras, contrasta com a decisão de ceder parte de seu uso às multinacionais, que já controlam os cerca de 50 outros satélites que prestam serviços no território nacional.
O SGDC foi construído pela Telebras com o objetivo de promover comunicações seguras para o sistema de defesa nacional, para as comunicações estratégicas do governo e promover o desenvolvimento socioeconômico do Brasil, buscando a massificação da Banda Larga. Resultado de um acordo bilateral firmado entre a França, a Telebras e a Agência Espacial Brasileira (AEB), o projeto tinha sido pensado com foco no atendimento de governo, educação, saúde pública e serviços de cidadania. Se insere, também, em iniciativas como as Cidades Inteligentes, pontos de Wi-Fi Social e garantir a conectividade em pontos não atendidos por operadoras.
Mudança de planos
Embora o projeto inicial fosse ter no satélite um caminho seguro para as comunicações governamentais, de defesa – com a interligação de projetos estratégicos como o Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras (Sisfron), o Sistema de Gerenciamento da Amazônia Azul (Sisgaaz) e o Sistema de Defesa Aérea (Sisdabra) – e de uso civil para a população, atendendo mais de dois mil municípios com conexão de banda larga, em especial na Região norte do país, pouco antes de seu lançamento, em fevereiro, o governo anunciou o leilão de 80% de sua capacidade. Adicionalmente, não obstante a Telebras ganhar gratuitamente a posição orbital 75 W, e ser dispensada de participar de uma licitação, com a condição de que fossem respeitados os objetivos do Plano Nacional de Banda Larga, as empresas que irão arrematar a banda Ka do satélite não têm, pelo edital de licitação, obrigações claras de atendimento, metas de universalização ou preço mínimo para vender esta banda larga.
A pressão promovida pela sociedade civil organizada desde então, com a participação do Clube de Engenharia surtiu efeito. Um novo edital foi preparado com modificações, incluindo a diminuição da capacidade licitada de 79% para 57%, e a data para o leilão remarcada. Segundo Marcio Patusco, diretor técnico do Clube e chefe da Divisão Técnica de Eletrônica e Tecnologia da Informação, “provavelmente as reações contrárias pesaram, mas a essência da privatização, e não de atendimento social, permanece”. Além dos dois lotes a venda, totalizando 23 Gbps dos 56 Gbps da capacidade total, 11 Gbps serão garantidos à Telebras e outros 12 Gbps não têm destino certo, ainda podendo ser vendidos em leilão. O novo edital trata da cota social apenas ao determinar que os compradores dos lotes deverão, para cumprir o PNBL, garantir 25% da capacidade de cada feixe com a entrega de banda larga.
A luta segue
Embora o governo tenha recuado parcialmente na venda do satélite nacional, a licitação segue sendo considerada uma enorme perda para o país. “Existe ajuizada uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) no Supremo Tribunal Federal pelo não cumprimento das obrigações formuladas por ocasião da aprovação do projeto dentro das condições do PNBL, como o atendimento social, a não exigência de licitação, o não pagamento do valor relativo à posição orbital, entre outros”, destaca Patusco.
Entidades da sociedade civil buscam impedir a venda por vias judiciais. Há representação no Ministério Público, uma denúncia junto ao Tribunal de Contas da União, sob a relatoria do Ministro Benjamin Zymler pautado para julgamento ainda esse mês e uma Ação Popular, que tramita na 13ª Vara Federal. Em face dessas reações, o leilão, que estava marcado para 28 de agosto, foi remarcado.