Soberania sobre as telecomunicações é tema de debate no Senge-RJ

Márcio Patusco

Especialistas discutem as vulnerabilidades brasileiras e alternativas para uma maior segurança das redes nacionais em seminário

A soberania com relação à rede de comunicação do Brasil é uma questão estratégica, mas que recebe pouca atenção da sociedade. O cenário tende a mudar com o avanço das big techs, impasses regulatórios e gargalos nas cadeias de fornecimento de equipamentos e materiais, além de espionagem internacional, fatos que estão trazendo à tona a vulnerabilidade do país. Por isso, recebeu grande interesse de profissionais da área o debate promovido sobre o tema pelo Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (SENGE-RJ) e o Rebrip. Participaram da mesa, o conselheiro do Clube de Engenharia do Brasil e conselheiro do Instituto Telecom Márcio Patusco e o doutorando do Programa de Pós-Graduação em Economia Política Internacional (PEPI-UFRJ) Marcus Tavares.

O debate ocorreu no âmbito do seminário “Caminhos da Economia Política Digital Brasileira”, realizado nos dias 11 e 12 (terça e quarta-feira). Especialistas e personalidades discutiram questões relativas à Geopolítica Digital, Mídias Sociais, infraestrutura de dados, minerais críticos e Indústria 4.0.  São assunto, que ao lado das redes de comunicação, compõem um quadro de aspectos que afetam não só a realidade política e econômica brasileira, bem como a inserção do país no cenário internacional.

Em sua apresentação, Patusco fez um apanhado histórico do setor, que até a década de 1960 apresentava grande descentralização e a partir de meados desse período passou a contar com maior controle por parte do governo central, tanto no sentido da regulação quanto da propriedade das empresas estratégicas. A partir da década de 1990, o setor passou por forte movimento de privatizações e de revolução tecnológica, nem sempre acompanhada da devida regulação. Atualmente, a rede de comunicações do país tem uma complexidade muito maior, devido ao grande peso da comunicação digital. É um ambiente em que os players mais importantes passam a ser as big techs, que controlam redes sociais, aplicativos de comunicação, Streaming e comércio eletrônico e possuem em sua infraestrutura softwares gerenciados por algoritmos e inteligência artificial e data centers, em sua maioria localizados no exterior.

As redes de satélites, com sua respectiva infraestrutura terrestre, são também dominadas por companhias estrangeiras, num quadro que fica ainda mais vulnerável diante da ofensiva da Starlink, que opera com equipamentos de baixa órbita. O sistema inclui operadoras de telefonia móvel e fixa, que ano a ano vêm dando maior peso a suas operações na oferta de serviços de internet de banda larga. Apesar disso, segundo Patusco, as principais empresas (Tim, Vivo e Claro) não chegam a controlar desse mercado, possuindo participação de 44%, enquanto o restante está nas mãos de pequenos provedores. Há 20 mil deles, fincados principalmente no interior.

A governança sobre o sistema, o que inclui a total regulação, a garantia de segurança inclusive com relação a espionagens, e a perspectiva de domínio tecnológico, pode ser qualificada, segundo ele, em cinco níveis que vão da menor ao maior grau de soberania. Capacitar o país para contar com uma estrutura de comunicações que assegurem não só a boa prestação de serviços a todos os brasileiros, mas também blindar o país contra ataques à sua soberania e riscos até de colapsos. Para o público presente, a situação da Amazônia, onde até órgãos públicos dependem dos satélites da Starlink, despertou grande interesse, tendo em vista a possibilidade de avanços na medida em que estão sendo instalados pelo governo cabos infrafluviais (infovia), mas a dependência do próprio sistema Gov.br de aplicações e infraestrutura das big techs, bem como a espionagem sofrida pela ex-presidente Dilma Rousseff são alertas ainda mais graves.

“É a sociedade civil, junto com a academia e junto com os organismos nacionais, inclusive o Congresso, que definem qual é o seu caminhamento e quais são os recursos que vai despender para criar uma soberania em rede de telecomunicações e que efetivamente não dependa de entidades externas que na verdade, proteja o país em relação a todos os problemas teve no passado”, concluiu Patusco.

Marcus Tavares concentrou sua apresentação nas questões ligadas às  relações internacionais e aos aspectos geopolíticos do setor. Na sua visão, as próprias grandes potências, a começar pelos Estados Unidos e a China, jogam nesse campo em arranjos em que o Estado e as grandes empresas atuam em conjunto, em “sinergia”. Não é à toa que Washington passou a combater os interesses da chinesa Huawei na medida em que ela assumiu liderança na corrida do 5G. Para ele, é fundamental que o Brasil procure avançar com relação à sua soberania no setor, com o objetivo principalmente de garantir a segurança das informações estratégicas.

“É muito complexo de se imaginar que grande parte da nossa infraestrutura, de alguma forma, ainda passe pela infraestrutura que é comandada por essas grandes companhias que, escancaradamente, são utilizadas para fins de vigilância de outros países”, ressaltou o pesquisador.

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