Alvo de políticas públicas desde o início dos anos 2000, a nanotecnologia é uma área que passou por períodos de menor ou maior destaque, mas, na prática, ainda não se estabeleceu no Brasil. Para o pesquisador do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE) Flávio Peixoto, falta uma visão sistêmica do país em torno do processo da inovação, congregando políticas públicas e investimento, com participação do Estado e da iniciativa privada. Este foi o tema de sua palestra, "A evolução da nanotecnologia no Brasil: desafios para difusão e inovação", no Clube de Engenharia, em 21 de agosto. O evento foi promovido pela Diretoria de Atividades Técnicas (DAT) e Divisão Técnica de Ciência e Tecnologia (DCTEC).

Programas estatais de incentivo à nanotecnologia
A área da nanotecnologia no Brasil começou a ter visibilidade no início dos anos 2000, a partir do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e do Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT). Com o objetivo de desenvolver o Programa Nacional de Nanotecnologia, o CNPq articulou redes de nanociência e nanotecnologia, e o MCT iniciou o financiamento do Instituto do Milênio de Nanociências. Essas primeiras iniciativas foram capazes de envolver centenas de pesquisadores e estudantes. De lá para cá foram lançados numerosos planos, programas e políticas em prol da inovação, propondo parcerias entre entidades pesquisadoras e empresas, incentivos fiscais para empresas, implantação de laboratórios e redes de nanotecnologia, criação de fundos setoriais, entre outros instrumentos. Tudo isso ocorreu com oscilações: maior ou menor destaque para a nanotecnologia.

A Pesquisa de Inovação (PINTEC) referente a 2009, 2010 e 2011, identificou 1132 empresas realizando atividades em nanotecnologia, espalhadas na indústria, setor de energia e de serviços, principalmente informática e telecomunicações. No entanto, apenas 66 eram consideradas inovadoras e produtoras dessa modalidade de tecnologia. A grande maioria era apenas usuária final. Entre 2012 e 2014 houve queda no número de empresas empregando nanotecnologia, justificada pelas oscilações nas políticas. E mais recentemente, na Estratégia Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação, vigente de 2016 a 2019, foi considerada área prioritária, mas ainda não há dados da sua aplicação.

Desafio é a integração
Segundo Peixoto, não existe um "nano-setor". A nanotecnologia tanto envolve a atuação de diversos setores - como física quântica, ciência da computação, química e engenharia -, como tem aplicação em numerosas áreas: biomedicina, energia, automobilística, cosméticos, etc. É definida como um conjunto de técnicas utilizadas para manipular a matéria (átomos e moléculas).

O pesquisador do IBGE e outros pesquisadores realizaram um estudo com 258 empresas, espalhadas em 15 diferentes atividades econômicas. A partir delas, propuseram trajetórias nanotecnológicas dividindo as aplicações em cinco sistemas, para ajudar a pensar políticas públicas: nanomateriais; nanobiotecnologia; nanoeletrônica; nanoenergia e meio ambiente;  nanomedicina; cosméticos e saúde. Com entrevistas, identificaram os principais desafios para o uso e desenvolvimento da área no país: falta de pessoal qualificado; capacidade de escala; transformação do conhecimento científico em produtos e processos. É um sinal, segundo Peixoto, de que a falta de política adequada não é um dos principais problemas: há investimento, mas não existem instrumentos e pessoal para aplicar.

"Notamos que as políticas estavam sendo pensadas e postas dentro de uma visão linear do processo de inovação. Supostamente se parte da invenção, a pesquisa é aplicada, ocorre produção e comercialização. Mas o que se nota é que o processo é muito mais complexo. Precisa-se de uma visão sistêmica para se pensar a inovação. Não basta dar recursos só para criação de capacitação e pesquisa. Temos vários outros componentes nesse sistema tão ou mais importantes do que a criação de capacitação", afirmou. A hipótese do grupo é de que grande parte da política foi elaborada sem haver um conhecimento mais profundo do que seriam as tecnologias.

São necessários instrumentos mais implícitos de estímulo à inovação, no campo da política macroeconômica, como taxa de juros e câmbio, por exemplo. Em países como Japão, Estados Unidos e Alemanha, as políticas de Estado foram fundamentais para o desenvolvimento da nanotecnologia. "Nesses países, o Estado sempre esteve presente. O mercado é atuante a partir de um determinado ponto, já com uma estrutura inicial, e uma demanda forte. A oferta cria demanda? Sim, mas depende do momento que se está naquele desenvolvimento", concluiu.

Para conferir a apresentação de Flávio Peixoto, clique aqui.

Receba nossos informes!

Cadastre seu e-mail para receber nossos informes eletrônicos.

O Clube de Engenharia não envia mensagens não solicitadas.
Pular para o conteúdo