Clube debate efeitos de termelétricas na Baía de Sepetiba

Projeto polêmico, que não apresentou Estudo de Impacto Ambiental, foi discutido por
especialistas, com apoio de DTEs

A instalação de quatro usinas termelétricas flutuantes na Baía de Sepetiba vem causando grande polêmica e seus impactos estão sendo avaliados pelas Divisões Técnicas Especializadas (DTEs) do Clube de Engenharia. Para aprofundar esse debate, foram reunidos especialistas em diversas áreas, que trouxeram contribuições importantes sobre as consequências ambientais, sociais e econômicas do projeto. Pesa contra o funcionamento dessas unidades geradoras de energia a falta de apresentação de Estudo de Impacto Ambiental (EIA-RIMA).
O debate foi promovido pela Diretoria de Atividades Técnicas e Divisões Técnicas Especializadas de Engenharia do Ambiente (DEA), Petróleo e Gás (DPG), Energia (DEN) e Recursos Minerais (DRM). Os palestrantes puderam colocar seus posicionamentos com relação a impacto das usinas sobre a vida marinha, os manguezais, a pesca e o turismo. Foram levados em consideração outros aspectos econômicos como o custo da energia, a importação de gás como combustível e a necessidade ou não da contratação dessa geração, que ficará a cargo da empresa turca Karpowership. Também entrou em debate o impacto gerado para instalação de linhas de transmissão.
A primeira palestrante foi a ecóloga Helena Bergallo, doutora e mestre em Ecologia pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), e professora da UERJ. Ela expôs sua preocupação com relação ao impacto sobre a vida em toda a região e criticou a dispensa de apresentação do EIA-RIMA para o projeto, que foi considerado estratégico e de utilidade pública pelo governo do estado. Segundo ela, houve um processo acelerado de licenciamento, iniciado em 2020, quando o país vivia uma crise hídrica que reduziu a produção de energia pelas hidroelétricas. Passado o problema dos reservatórios de água, manteve-se a contratação, mesmo a um custo de R$ 1.690 por kWh, que seria sete vezes mais alto que o normal.
A especialista também criticou o licenciamento separado das torres de transmissão, como se fossem projetos separados. Para levar a energia para o continente, serão necessárias 36 torres de transmissão, o que deve provocar a derrubada de 7,33 hectares de vegetação de mangue e Mata Atlântica. Ela também salientou a poluição atmosférica que pode ser gerada, principalmente pelo uso de motores a diesel, e até o risco de explosões. “O boto cinza é uma espécie ameaçada de extinção. Na Baía de Guanabara havia centenas deles na década de 1980 e hoje não há mais do que 30 indivíduos. Na Baía de Sepetiba é onde tem a maior população, que sofrerá forte impacto. Não foram considerados também os impacto  do resfriamento e dessalinização. Serão 23 milhões de litros de água por mês, lançados a 15 graus acima do valor de entrada para resfriar os sistemas a bordo. Não há flora e fauna que aguente isso!”, destacou a Bergallo.
O professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) Francisco Gerson
Araújo, que possui doutorado em Environmental Health Sciences - University of London (1992), também demonstrou preocupação com relação à elevação da temperatura da água da baía e outros efeitos danosos. Ele alertou para o alto risco de as termelétricas afetarem a vida marinha e provocarem migrações de peixes. O especialista também salientou o fato de já ser preocupante a baixa renovação de água em alguns pontos da baía, o que pode se agravar com a ancoragem das usinas flutuantes e outras instalações. “Vai haver perda de biodiversidade da baía, perda de espécies, vai ter impacto na pesca artesanal, as comunidades tradicionais vão sofrer, mas também será afetada a pesca esportiva, por lazer. Se o ambiente é ruim, os organismos que vivem naquele ambiente sofrem e o homem que vive em contato com esse ambiente vai sofrer. Na minha visão tudo será alterado”, alerta o pesquisador.
A professora de Geografia da UERJ Catia Antonia da Silva não só criticou a falta de Estudo de Impacto Ambiental para o projeto como fez observações sobre a necessidade de mudanças nos critérios utilizados nesses licenciamentos. Segundo ela, a região já sofre com o impacto de diversos projetos e o poder público tende a não avaliá-los em conjunto, o que seria mais correto. Ela citou a expansão do Porto de Itaguaí, a construção do gasoduto do pré-sal, entre outros. Junto com as usinas, as condições de navegabilidade e até fatores de Segurança Nacional podem ser afetados. "É preciso fazer uma avaliação global dos processos cumulativos da Baía de Sepetiba. Ter isso como um documento. Temos um conjunto de dados muito fragmentados e queremos juntar para uma melhor governança ambiental”, salientou a pesquisadora.
Nas considerações finais, os chefes da Divisões Técnicas que participaram do evento elogiaram os palestrantes e agradeceram as contribuições dadas ao debate. O chefe da Divisão de Recursos Naturais Renováveis (DRNR), Ibá dos Santos Silva, ressaltou que o Clube também tem interesse na questão pela proximidade da Sede Campestre de Guaratiba com o empreendimento, e demonstrou preocupação com os impactos ambientais e sociais do projeto, defendendo novos debates sobre o tema. “Por mais estratégico que seja um empreendimento, tem que ter o Estudo de Impacto Ambiental”, defendeu ele.
Abílio Valério Tozini, chefe da Divisão de Engenharia do Ambiente (DEA), fez duras críticas ao processo de licenciamento do projeto e à decisão do CECA (Conselho Estadual de Controle Ambiental) de liberar a instalação das termelétricas. “Eu, como engenheiro, me sinto envergonhado que determinadas instituições da engenharia afiancem e deem voto para rasgar a legislação ambiental brasileira. Quando a CECA aprovou não fazer o EIA-RIMA, ela aprovou rasgar a legislação”, ressaltou Tozini.

Imagem: Pixabay

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