Por Vilmar Sidnei Demamam Berna*
Este mês de junho, no Rio de Janeiro, mais um ambientalista parte deixando um enorme vazio, tanto no coração de familiares e amigos, mas também para as lutas ambientais. A questão que deve nos preocupar não é sobre a morte em si, por que ela é certa para todos nós, mas é o vazio que estão deixando. Quantos jovens, hoje, estão dispostos a abraçarem causas coletivas, como as lutas ambientais?
Desta vez, foi o arquiteto Marco Leão, que veio se somar às outras perdas também importantes no movimento ambiental fluminense, como o professor Elmo Amador, Omar Serrano, Dra. May, Rosalvo, Profº Breno Marcondes, Orlando Valverde (CNDDA), o Promotor João B. Petersem, o professor JB, além dos que foram assassinados na luta, como o Dionísio (abatido por caçadores enquanto defendia a REBIO do Tinguá), Dr. Álvaro, da Serena (assassinado em Angra dos Reis na resistência contra invasores dos manguezais), Seu Edu (assassinado em Maricá lutando contra ladrões de areia), Paulo Farias (estranhamente “suicidado” num ventilador); e tantos outros, lembrando aqui apenas os que tive o prazer de conhecer e de militar na defesa do meio ambiente no Estado do Rio de Janeiro. Se ampliarmos o olhar, a lista será ainda maior.
Importante lembrar que, como convém a uma democracia, o ambientalismo sempre foi um espaço de negociação e debate de ideias. Enquanto uns escolhem investir suas forças na denúncia e no combate aos problemas ambientais, atuarem através das ONGs ou sindicatos, outros se capacitam para ser solução e escolhem atuar através dos poderes públicos ou mesmo nas empresas e universidades. Entretanto, todos têm em comum a persistência em não abandonarem as causas ambientais. Uma luta por vezes ingrata, que não ajuda a pagar as contas, que por vezes rouba a vida e também a saúde, o emprego, a paz, que estressa, angustia, deprime, faz perder o sono, mas que, para alguns, é tão fundamental quanto o ar que respiram.
Uma luta em que se costuma acumular muito mais derrotas que vitórias. Entretanto, graças a estas vitórias – e por vezes, até mesmo em função das derrotas – a sociedade ampliou sua consciência ambiental, ampliaram-se os direitos ambientais e as legislações, criaram-se estruturas para a defesa do meio ambiente tanto nos setores públicos, nos poderes executivos, legislativos, judiciários, quanto na sociedade, incluindo não só as empresas mas também sindicatos, associações de moradores. O que antes eram lutas praticamente restritas ao chamado movimento ambientalista, hoje ganhou as ruas, a mídia, as mentes, os corações, as organizações, os poderes políticos, e nada disso se deu por acaso. O processo histórico e democrático não é obra do acaso. Ele resulta do esforço dos que lutaram, dos que nadaram contra a corrente, que se sacrificaram, não desistiram. Por isso, é absolutamente fundamental – até por uma questão de justiça -, não esquecer estes guerreiros, ainda que possamos discordar de alguns nos méritos e objetivos. Sem eles, a situação ambiental estaria muito pior.
Suas vidas, suas lutas, seu legado merece nossa reflexão: nossa educação tem contribuído para formar uma nova geração de cidadãos e cidadãs, conscientes de seus direitos e deveres, ou acabou caindo na vala comum de uma educação para o mercado de trabalho, como se houvesse uma vaga esperando cada aluno no final do curso?
As próprias ONGs do movimento ambientalista estão preocupadas em formar uma nova geração de quadros ambientalistas, ou estão se deixando apequenar para se transformarem apenas em ONGs de projetos, para garantir a própria sobrevivência ou de seus diretores?
As perdas que a sociedade sofreu com o novo Código florestal podem ser vistas já como uma consequência deste novo contexto? Neste sentido, virão novas perdas por aí? A quem interessa um movimento ambiental enfraquecido? O que fazer para inverter este processo e recuperar e fortalecer a cidadania socioambiental e suas instâncias de luta e organização?
* Vilmar Sidnei Demamam Berna é escritor e jornalista, fundou a Rede Brasileira de Informação Ambiental (REBIA) e edita deste janeiro de 1996 a Revista do Meio Ambiente (que substituiu o Jornal do Meio Ambiente) e o Portal do Meio Ambiente. Em 1999, recebeu no Japão o Prêmio Global 500 da ONU Para o Meio Ambiente e, em 2003, o Prêmio Verde das Américas – www.escritorvilmarberna.com.br