Conferência da ONU em Belém reforça discussão sobre questões sociais e proteção das florestas, mas mundo precisa definir melhor responsabilidades
A realização da Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas em Belém (PA) expôs os desafios o que o mundo deve enfrentar para rumar no sentido do desenvolvimento sustentável. Testou a capacidade de uma capital da Amazônia para sediar um evento desse porte. O resultado, após duas semanas de conferências, mostrou que os esforços trouxeram avanços com relação aos objetivos propostos, mas também trouxeram algumas frustrações. A cidade recebeu muitos investimentos e conseguiu abrigar o encontro dignamente, apesar de alguns incidentes, enquanto no campo diplomático houve 29 decisões aprovadas por consenso, que abrangem temas como transição justa, financiamento da adaptação, comércio, gênero e tecnologia. Apontam para caminhos a serem pavimentados nas próximas conferências, a começar pela próxima daqui a um ano no Turquia, já tendo em vista o compromisso de triplicar os recursos para a transição até 2035 e maior ênfase no desembolso por parte dos países desenvolvidos, apesar da falta de maior definição das responsabilidades.

A COP30 resultou entre seus avanços no reconhecimento dos direitos indígenas como estratégia climática e de seu papel na proteção das florestas, bem como na adaptação ao clima. É fato também que ficou de fora do documento final a legitimação dos chamados mapas do caminho, que estabeleceriam um roteiro a ser seguido pelos países contra as mudanças climáticas, mas há de se considerar como positivo o debate sobre essa estratégia e a proposta do Brasil de elaborar documentos a serem apresentados na próxima COP. Nova perspectiva para o comércio internacional que o coloca no rumo de tecnologias mais limpas também foi um sucesso, bem como a aprovação do Plano de Ação de Gênero de Belém.

A conferência da capital paraense apresentou outro legado importante, que foi a Meta Global de Adaptação (GGA). Muitos a consideram fraca, por só ter incluído cerca de 60 indicadores, em vez dos 100 propostos. No entanto, sua oficialização vai contribuir para se avaliar mais objetivamente como andam os alertas de emergência, obras contra enchentes e os sistemas de prevenção, por exemplo. Outra conquista valiosa foi a criação do Mecanismo de Belém para uma Transição Justa, que prevê uma rota permanente de transição para uma economia de baixo carbono sem penalização dos mais pobres. O compromisso de triplicar o financiamento para adaptação até 2035 é outro ponto de destaque entre os progressos obtidos.

Mas não faltaram queixas de ambientalistas sobre a ausência de metas mais concretas para o financiamento climático, principalmente com relação à responsabilização dos países ricos. A culpa desse grupo de nações ao longo do tempo para o aquecimento global é enorme, mas muitos deles preferem passar uma borracha no passado enquanto outros sequer aceitam discutir a pauta. É o caso dos Estados Unidos, cujo governo Trump não participou da COP30. Houve também o fortalecimento do Fundo Florestas Tropicais para Sempre, o TFFF, que ganhou o reforço de caixa com doações anunciadas pela Alemanha, Noruega, França e Portugal, sendo que mais de 50 países assinaram a sua criação.

Membro da Divisão Técnica de Recursos Hídricos e Saneamento (DRHS), o conselheiro e engenheiro agrônomo Ibá dos Santos Silva afirma que mesmo que os consensos não tenham sido obtidos, é notável o esforço feito pelos governos de grande parte dos países que elaboraram suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs). São programas de metas voltadas principalmente para o combate às mudanças climáticas, que em vez de uniformizar as ações, permite a cada um estabelecer seu próprio plano. Foi uma estratégia lançada pelo país, com seu apoio, desde a COP 20, em Lima, no Peru. O Brasil, segundo ele, tem muito a ganhar com o aprofundamento das discussões e a implementação de ações práticas, que dependerão em grande parte da engenharia.
“A preservação ambiental não pode ser separada da justiça social e da luta contra a exploração econômica que causa a degradação da natureza. Para Chico Mendes, um esforço ambiental superficial, comparado ao cuidado de um jardim, é inútil se não combater as causas estruturais, como o desmatamento, a violência no campo e a ganância que exploram a terra e expulsam comunidades. Por isso, temos que investir na bioeconomia, que será capaz de preservar o meio ambiente e combater o problema da fome”, ressalta Ibá.

O conselheiro Abílio Tozini, integrante da DTE de Engenharia do Ambiente e engenheiro químico, lamenta que a conferência não tenha resultado num plano mais concreto de reflorestamento de áreas degradas e de proteção às florestas ainda existentes. Isso porque o papel desses biomas para o equilíbrio climático muitas vezes é subdimensionado, em parte por conta da grande ênfase dada pelos ambientalistas no papel dos combustíveis fósseis para o aumento do efeito estufa. Segundo ele, seria mais vantajoso para o país buscar dar sua contribuição contra as mudanças climáticas salvando as matas e investindo em agroflorestas do que acabando com a exploração do petróleo. O mineral ainda pode não só gerar riqueza como exercer um papel importante na transição energética e na recuperação ambiental.
“A COP 30 foi bem-sucedida. Eu acredito que diante das dificuldades que se impuseram, muitas delas foram superadas e o resultado, na minha avaliação, não foi frustrante. Porque ninguém podia esperar que ia ser um debate conclusivo, com unanimidade entre as nações, com os desafios que foram colocados”, salientou Abílio.
No campo diplomático, ainda há muito trabalho pela frente. A COP 31 será sediada pela Turquia, numa copresidência com a Austrália, que assumirá a liderança das negociações. Todos os temas discutidos em Belém ainda estarão na pauta e novas oportunidades surgirão para que os governos superem os impasses em nome da preservação do planeta.




