Palácio Monroe: documentário traz de volta a luta do Clube de Engenharia contra a demolição

1976: regime militar no país, milagre econômico, crescente número de automóveis nas grandes cidades, construção do Metrô no Rio de Janeiro e a cidade começando a ganhar arranha-céus, muitos ao preço da demolição de numerosos prédios antigos. Para que fosse construído um estacionamento, um deles foi o Palácio Monroe, antiga sede da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e outras instituições públicas, localizado no final da Avenida Rio Branco, na Cinelândia. Não foi uma demolição facilmente conquistada: instituições diversas disputaram as posições pró e contra, entre elas o Clube de Engenharia, contrário à demolição. Por esse motivo, a entidade está entre as que foram presenteadas com sessões especiais gratuitas de pré-estreia do documentário "Crônica da Demolição", de Eduardo Ades, a respeito do processo que levou ao fim do Palácio Monroe. Após a primeira sessão, no dia 8 de maio, o público participou de um debate com o diretor, além do historiador Daniel Levy de Alvarenga, que vem estudando a atuação do Clube em sua dissertação “Palácio Monroe: a construção de um vazio”. A segunda sessão especial aconteceu no dia 9 de maio, terça-feira, no Cinevídeo, cineclube que exibe filmes temáticos, sempre às 17h, toda terça-feira. Ambas as exibições foram promovidas pela Diretoria de Atividades Culturais e Cívicas. O filme será lançado no Rio de Janeiro, dia 11 de maio, no circuito Estação NET de Cinema.

A história
O Palácio Monroe foi projetado para ser o "Pavilhão do Brasil" na Exposição Universal de 1904, ocorrida em Saint Louis, nos Estados Unidos. Por isso, o arquiteto e engenheiro militar coronel Francisco Marcelino de Sousa Aguiar concebeu uma estrutura metálica capaz de ser desmontada e transportada. Em 1906, foi remontado na Cinelândia, para sediar a Terceira Conferência Pan-Americana. O nome, Palácio Monroe, homenageia James Monroe, antigo presidente dos Estados Unidos, criador do Pan-Americanismo. Segundo o filme, por muito tempo o Palácio Monroe foi o "salão de festas" da elite carioca. Entre 1914 e 1922, foi sede provisória da Câmara dos Deputados, que veio a se instalar no Palácio Tiradentes. Depois, até 1937, foi sede do Senado Federal, quando foi fechado durante o Estado Novo. Entre 1945 e 1946 foi sede provisória do Tribunal Superior Eleitoral. Na década de 1950, passou por reforma e, em 1960, já com a sede do governo federal em Brasília, o Monroe se tornou escritório de representação do Senado no Rio de Janeiro, e, à época do regime militar, sede do Estado-Maior das Forças Armadas. Em 1974, o governo estadual decretou o seu tombamento, que o governo federal negou, e a demolição ocorreu em 1976. No seu lugar, foi construído um chafariz, atualmente sem água, e, já nos anos 2000, uma garagem subterrânea.

Arquitetura: opiniões não resistiram ao tempo
Quando o Palácio Monroe foi montado no Rio de Janeiro, no início da década de 1900, foi o primeiro edifício oficial de estilo não imperial. Na prática, o símbolo da República, e assim foi até a construção dos prédios oficiais de Brasília, com o modernismo de Niemeyer. No entanto, ao longo do tempo, no entorno do Monroe a chegada dos elevadores traz arranha-céus, enormes edifícios cúbicos de concreto e janelas de vidro quadradas. "A cidade é um organismo dinâmico que não podemos frear", afirma no filme a arquiteta e urbanista Margareth da Silva Pereira.

Logo, a arquitetura do Rio de Janeiro foi se tornando eclética: os prédios antigos, como o Palácio Monroe, Teatro Municipal e o Palácio Pedro Ernesto (Câmara Municipal) passaram a dividir espaço com modernos e altíssimos edifícios. Começou, então, uma campanha na grande mídia colocando o Monroe, exclusivamente, como atrasado. Um dos que compartilhavam dessa opinião era o arquiteto Lúcio Costa, um dos dirigentes do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Ele chegou a passar abaixo-assinados em associações de arquitetos para pressionar pela demolição do Monroe.

Especulação imobiliária e pressões
Segundo o arquiteto e urbanista Alfredo Britto, um dos entrevistados no filme, no período militar "a cidade começou a ser tratada como um pasto de negócios, de interesses financeiros e políticos". Era grande a especulação imobiliária, e as ruas da cidade se expandiam para receber o crescimento do setor automobilístico.

Segundo Daniel de Alvarenga, o Clube de Engenharia e o Instituto dos Arquitetos do Brasil foram as instituições que pediram ao IPHAN o tombamento do conjunto arquitetônico da Cinelândia. Lá, o pedido passou por debates: um arquiteto de destaque, Paulo Santos, desejava o tombamento, mas Lúcio Costa posicionava-se contra o ecletismo arquitetônico da cidade, classificando como “mau gosto”. Ineditamente, sem considerar o conjunto arquitetônico, alguns prédios foram tombados e outros não. “Sem o tombamento do Monroe foi dada a ‘carta branca’ para a demolição”, esclarece Alvarenga.

Motivações políticas
Ainda segundo o historiador, em 1974, o então ministro da Justiça, Armando Falcão, despachou com o presidente Ernesto Geisel um memorando com instruções para que a partir de então o governo atuasse junto aos órgãos de imprensa para incutir na opinião pública opinião favorável à demolição do Monroe. Foi quando se intensificou a campanha do jornal O Globo. Esse fato está expresso em um documento presente no arquivo Geisel do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas. Para Daniel, é um documento definitivo para ter certeza da aliança entre o regime militar e o poder midiático. “O documento dá materialidade para a campanha pró-demolição”, afirma.

Eduardo Ades, diretor, produtor e roteirista do documentário, na posição de alguém que não viveu o impacto da vida política do Monroe, afirmou que sua motivação foi descobrir por que, afinal, o Monroe foi demolido. O conselheiro Guaraci Corrêa Porto, no debate, questionou a possibilidade de o governo militar da época ter tentado demonstrar força frente a um símbolo do poder Legislativo. A hipótese também passa por Daniel de Alvarenga, que afirmou que havia um projeto federal de reduzir a centralidade política do Rio de Janeiro, assim como a potência do poder Legislativo.

A engenheira civil Maria Alice de Alencar demonstrou preocupação com a possibilidade de outros prédios históricos passarem por demolição: "É muito importante um documentário como esse para vermos o que se pode fazer para não volt
ar a acontecer tamanho descaso com o patrimônio". Para Eduardo Ades, "preservar patrimônio é uma questão da qual o povo precisa participar".

A atuação do Clube de Engenharia
Segundo Daniel, a resposta à pergunta "Como deixaram demolir o Monroe?" leva aos movimentos de resistência de pessoas e entidades que tentaram impedir a demolição. Uma delas foi o Clube de Engenharia, que em 1975 lançou um manifesto contrário à demolição, assinado por 162 arquitetos, engenheiros e críticos de arte. Daniel vem estudando a historiografia do Palácio Monroe há cerca de quatro anos, procurando entender melhor as diversas hipóteses atribuídas à demolição e os atores que participaram dos debates. Em sua pesquisa, Daniel pretende descobrir qual era o perfil dos signatários do manifesto; qual foi a repercussão do documento. "A ideia é tratar o manifesto encabeçado pelo Clube de Engenharia como um documento histórico e identificar os argumentos utilizados, a linguagem, e objetivos”.

Confira o trailer do filme aqui.

Confira a programação de "Crônica da Demolição" nos cinemas comerciais de 11 a 17 de maio:

Rio de Janeiro
Estação NET Rio 1 - 16h10 e 20h
Instituto Moreira Salles - Quinta às 19h30 (com debate)
Cine Santa - 17h20
Cine Cândido Mendes - 19h50
Odeon - 14h

Niterói
Cine Arte UFF - somente dia 11, às 15h (com debate)

São Paulo
Itaú Frei Caneca 5 - 18h

Porto Alegre
Cine Bancários - 15h e 19h

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