“A engenharia é para atender ao ser humano”, diz Stelberto Soares em mais um Esquenta EFEEng

A crise hídrica brasileira foi tema do terceiro Esquenta EFEEng, que aconteceu no último dia 11 de julho. A palestra apresentada pelo engenheiro sanitarista e membro do conselho diretor do Clube de Engenharia, Stelberto Soares, foi transmitida ao vivo e acompanhada por estudantes de vários lugares do Brasil.

Stelberto Soares acredita que a crise hídrica no Brasil não começou agora e tem se intensificado ainda mais devido às mudanças climáticas que podem ser percebidas de diversas formas e em todo o nosso planeta. O engenheiro destaca que essas mudanças têm forte influência humana e, antes mesmo de a crise hídrica provocar um problema de abastecimento de água e energia elétrica para o país, ela é um problema em si. Para Soares, os rios urbanos contam com saneamento zero, o que é preocupante e absurdo. “A baía de Guanabara é composta por 55 rios, dos quais 54 são praticamente esgoto puro. Só o de Guapimirim consegue se filtrar devido à persistência do único manguezal que sobrou por ali”, destacou.

A crise hídrica enfrentada recentemente pela região metropolitana de São Paulo foi um dos exemplos utilizados para explicar a importância da interligação das bacias, plano que existe há quase três décadas e ainda não foi implementado pelo poder público. “Quando a exigência do sistema de saneamento é gerar dividendos, não se gasta em algo que possa não ser extremamente necessário. Isso somado à falta de chuvas causou a crise hídrica de São Paulo. Foi preciso faltar água para que fosse seguido um plano que já existia há cerca de 25 anos”, explicou Stelberto.

Outro problema apresentado foi o desmatando, que segue aumentando ano a ano no Brasil, sobretudo na última década. Segundo o palestrante, os rios sofrem com o desmatamento porque a chuva corre rápido demais diretamente até eles e não se infiltra no solo de forma mais lenta. Com a floresta em pé, a água se infiltra e vai se dosando até chegar nos lençóis subterrâneos. Sem floresta, na época da seca não tem água chegando a estes rios.

Saneamento ambiental
Outro ponto importante da palestra de Stelberto Soares foi a necessidade de enxergarmos o saneamento de forma integrada. Não se pode somente falar em abastecimento de água e tratamento de esgoto. De acordo com o palestrante, água, esgoto, lixo, qualidade da água e do ar estão totalmente integradas, isso sem falar da conexão de todos esses itens com a ação humana. “Tudo isso chamamos de saneamento ambiental”, afirmou.

Soares também chama atenção para o estado em que estão hoje os rios urbanos na cidade do Rio de Janeiro. “Quando se fala em problema hídrico, o principal problema do Rio de Janeiro é o Paraíba do Sul, que precisa de atenção. Mas por que os rios Maracanã, Joana e Iguaçu, por exemplo, tem que ser esgoto puro? O Rio Iguaçu, de um lado está a refinaria e do outro o lixão de Gramacho. Então, quando se fala em crise hídrica, a preocupação não pode ser só energética, mas sim a vida humana”, enfatizou. O engenheiro sanitarista também explicou o que gerou a crise hídrica de 2019, e que se repetiu em 2020, no Rio de Janeiro: a falta de saneamento do rio Guandú. “Reduziram de 190m³ por segundo para 110m³ por segundo a extração de água no Guandú. A consequência disso foi uma menor quantidade de água para diluir as impurezas, aumentando a quantidade de geosmina e gerando a necessidade de mais produtos químicos e tratamento mecânico para tratar essa água”, explicou.

Água também é política
Tanto o estudante de Engenharia Ambiental da Universidade Federal Fluminense (UFF), Rafael Franco, que mediou a Live, como o palestrante, destacam a complexidade do tema da água, mas também o quanto ela é fundamental para a vida. Mesmo discutindo questões técnicas e, algumas vezes, políticas, fica nítido que o tema não pode ser descolado da questão humana. Foi o que destacou Stelberto: “como engenheiro, não faço engenharia pura e simplesmente para fazer obras. As obras devem servir ao ser humano. Entre os 17 itens do Desenvolvimento Sustentavel, o primeiro deles é a extinção da miséria, por exemplo. Água é vida e tem que estar sob o controle do Estado, assim como saúde e educação”.
O engenheiro também defende que os dois últimos itens deste documento são extremamente relevantes. “O penúltimo fala da paz, justiça e das instituições fortes. O último, fala da necessidade de parcerias. Ou seja, a integração das instituições deve servir para uma análise do todo. Não basta analisar só tecnicamente, é preciso analisar politicamente”, enfatizou Stelberto.

Rafael Franco concorda e apresentou dados do Trata Brasil que mostram que um/a em cada sete homens e mulheres brasileiros/as tem dificuldade de acesso à água tratada. Para o estudante, isso mostra que a questão do acesso à água é permanente, não é algo recente, mas sim permanente na vida de muitos brasileiros. “Fica nítido com a palestra de Stelberto que esta não é uma crise puramente e simplesmente hídrica ou climática, é uma crise de prioridades, de gestão das bacias, dos reservatórios, de recursos naturais”, afirmou Franco.
Rafael Franco também enfatizou a importância da participação política nos tempos atuais, além da necessidade de aliar o olhar técnico ao humano. “O estudante precisa discutir e pensar, não só se abitolar às normas, porque pelas normas às vezes tudo parece certo, mas o olhar humano precisa existir”, disse o estudante.

Stelberto Soares também acredita ser fundamental o papel dos estudantes para essas discussões e fez um chamado à categoria: não é o momento de ficar em cima do muro. “É uma defesa da civilização, independente de posição política de cada um. É necessário que cada um participe onde puder, seja no movimento estudantil, nas associações de moradores, onde for possível”, declarou.

O diretor do Clube finalizou destacando o momento difícil que o Brasil atravessa, mas também falou sobre a necessidade de pensarmos quais são as prioridades do país. “Se na engenharia ou nas áreas técnicas temos que definir prioridades, na política também. E eu reitero: temos que estar presentes para que o nosso país possa se desenvolver de maneira democrática e para que o nosso povo possa ter o melhor nível de vida, com o fim da miséria”, finalizou.

A Live completa está disponível no Instagram da SAE e você pode assistir CLICANDO AQUI. O Esquenta EFEEng acontece todas as quartas às 19h17 e domingos às 16h09, ao vivo, também na página da SAE no Instagram: @sae.clubedeengenharia

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