Francis Bogossian é engenheiro, presidente da Academia Nacional de Engenharia (ANE) e ex-presidente do Clube de Engenharia
Publicado no Jornal do Brasil (11/05/2018)
Logo após o desastre da Samarco, em Mariana, em 2015, houve uma grande mobilização das mineradoras com a contratação de consultores, execução das ações corretivas e preventivas detectadas nos planos de ação relacionados com a segurança e integridade das suas barragens de rejeitos, revisão dos seus processos de lançamento de rejeitos, monitoramento e controle das suas estruturas. Com o passar do tempo, parece que houve um arrefecimento nessas iniciativas.
Foi criada, naquele momento, uma subcomissão no Senado para revisar e aperfeiçoar a Lei Federal nº 12.334 de Segurança de Barragens. Essa comissão já foi desfeita, e o trabalho não foi conclusivo.
Vale ressaltar que a Lei de Segurança de Barragens, de setembro de 2010, é bastante completa e abrangente e, no entanto, continua não sendo obedecida completamente.
Ao mesmo tempo, a Assembleia Legislativa de Minas Gerais acatou o projeto de lei de iniciativa popular proposto pela campanha “Mar de Lama Nunca Mais”, promovida pelo Ministério Público. O projeto de lei nº 3.676/16, que dispõe sobre o licenciamento ambiental e a fiscalização de barragens no estado, está com seu processo de tramitação na Assembleia Legislativa praticamente parado. Esse projeto, para o qual há diversas sugestões, tende a minimizar o risco de novos desastres com a proibição do método de construção com alteamento a montante e da construção de barragens próximas a áreas habitadas. Exige também planos robustos para resgates e contingências no caso de eventual acidente, além de ter um foco grande na minimização de impactos ambientais.
A nova lei prevê também um processo de licenciamento bem mais completo do que o praticado atualmente, entre outros pontos importantes. Como Minas Gerais é a referência para a indústria da mineração no Brasil, uma lei com requisitos fundamentais para a segurança das barragens de rejeitos, se aprovada, será mais um importante elemento dentro do arcabouço legal sobre o tema, que certamente irá contribuir para que novas tragédias como a de Mariana não se repitam e, sem dúvida, se tornará uma diretriz de aplicação nacional.
Além das leis existentes e as novas que estão sendo criadas, a principal mudança para tornar as barragens mais seguras é a conscientização das mineradoras que são responsáveis pelos seus ativos, ações e omissões, decorrentes de suas operações. A Lei Federal de Segurança de Barragens é clara quanto a essa responsabilidade.
Portanto, podemos dizer que, as mudanças esperadas com o acidente não estão acontecendo no ritmo necessário. As mineradoras podem contar com a engenharia brasileira de barragens, que é das mais respeitadas do mundo, não nos faltando engenheiros e geólogos experientes, empresas de engenharia altamente qualificadas e universidades desenvolvendo pesquisas e inovação nessa área de conhecimento.
Tenho visto que é necessário melhorar e muito o investimento na qualidade dos estudos do meio biótico com suas áreas protegidas, flora e fauna, do meio socioeconômico, com diagnóstico detalhado da região, do seu patrimônio arqueológico e cultural e do meio físico que são os estudos geológicos, geotécnicos, hidrológicos e climáticos. Precisamos também investir nas novas tecnologias de disposição de rejeitos que reduzem significativamente o risco de acidentes como os que temos presenciado. São métodos que diminuem a quantidade de água dos rejeitos aumentando significativamente o teor de sólidos, favorecendo a estabilidade dos reservatórios e consequentemente a estabilidade das barragens que os contém. Cabe ressaltar, que pela primeira vez a FINEP, junto com o BNDES, está promovendo o Inova Mineral, que é um programa de fomento para as empresas ligadas à indústria da mineração, para que desenvolvam pesquisas e produzam inovações tendo como um dos principais focos, a minimização de riscos e a sustentabilidade.
O aprimoramento dessas técnicas e o aprofundamento dos estudos citados devem ser incentivados pelos órgãos reguladores da indústria e pelos órgãos ambientais responsáveis pelos licenciamentos, já que a redução de riscos é um benefício para toda a sociedade.
Projetos bem elaborados e detalhados, com todos os riscos corretamente analisados e mitigados, associados às compensações ambientais e sociais pertinentes, certamente evitarão que venham a ocorrer novos acidentes nas barragens de rejeitos em operação Brasil.