País pode aumentar sua produção do mineral e estimular a instalação de indústrias de baterias em vista da transição energética
O aumento da demanda mundial pelo lítio desperta no Brasil o interesse pela extração desse mineral. Apesar de atualmente a participação do país nessa produção ainda ser baixa, há a expectativa de crescimento desse patamar na medida em que estão sendo feitos investimentos tanto do setor público quanto privado em pesquisas. Além da ampliação dessa atividade econômica, a maior oferta do material pode estimular também a instalação no país de fábricas de baterias, cuja relevância tende a aumentar com o uso intenso de equipamentos eletrônicos e com a expansão da frota de veículos elétricos.
Grande parte das previsões que estão sendo feitas em torno da transição energética pode até ser especulativa, mas diversos fatores reforçam o caráter estratégico do lítio. Tanto que já vem sendo chamado de “ouro branco”, pois a descarbonização não só favorece a necessidade do uso de baterias a íon-lítio nos veículos como no armazenamento de energias de fontes renováveis e intermitentes. As maiores reservas do mineral estão no Chile, com 9,3 milhões de toneladas, num ranking em que em seguida vem a Austrália (6,2 milhões de toneladas) e a Argentina (2,7 milhões de toneladas).
O balanço é do Serviço Geológico Norte-Americano que, em termos de reservas lavráveis, coloca o Brasil na sétima posição do ranking, com um total de 390 mil toneladas. Em termos de produção, o primeiro lugar ficou com a Austrália (86 mil toneladas), o segundo com o Chile (44 mil toneladas) e o terceiro com a China (33 mil toneladas). Nesse quesito, a produção brasileira ocupou a quinta posição, com 4,9 mil toneladas extraídas em 2023, o que é quase o dobro do resultado do ano anterior.
Com uma expectativa de que a demanda mundial vá dobrar até 2035 e com sinais promissores de novos depósitos no território brasileiro, é possível não só prever um aumento na extração nacional do minério como uma atração de investimentos para a instalação de indústrias de baterias no país. Entre 2022 e 2023, os pedidos de mineração envolvendo esse mineral quadruplicaram, segundo a ANM (Agência Nacional de Mineração). De acordo com um estudo da consultoria A&M Infra, o Brasil tem potencial para atingir 25% da produção mundial nos próximos anos.
O Brasil possui lítio depositado no subsolo presente em rochas ígneas, mais especificamente nos pegmatitos. A ocorrência em outros países, como o Chile, se dá na forma de sais em salvouras evaporíticas, como as do deserto do Atacama. Para o país, há uma vantagem na sua forma de depósito, que tende a minimizar o impacto ambiental da mineração, devido ao fato de se poder aproveitar outros minerais associados na mesma rocha, o que reduz o potencial de produção de rejeitos.
Segundo Maisa Abram, chefe do Departamento de Recursos Minerais (DEREM) do Serviço Geológico do Brasil (SGB), outra vantagem para o Brasil no âmbito do mercado internacional é a possibilidade de utilizar energia limpa na separação do lítio. Empresas que se comprometem com a produção descarbonizada podem adotar o Selo Verde a esse mineral, que ganha maior valor para a exportação.
As principais reservas de lítio do país estão no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais, mas há depósitos promissores também na província da Borborema, entre o Rio Grande do Norte e a Paraíba, e na subprovíncia de Solonópole, no Ceará. Outras fontes importantes estão em Itambé, na Bahia, bem como no Sul do Tocantins e no Nordeste de Goiás.
“O conhecimento de novas reservas requer um investimento maior em pesquisa, pesquisa básica, em mapeamento geológico, em estudos geofísicos específicos para se poder delinear novos depósitos e recursos”, explica Abram.
Investimentos também estão sendo feitos para um aproveitamento melhor do material extraído do subsolo, com maior participação na produção nacional através da extração do lítio presente no mineral espodumênio (um silicato de lítio e alumínio). Esse beneficiamento expande a cadeia produtiva, que ganha novas etapas e maior valor agregado.
A mineração responsável, mesmo com os impactos inerentes à atividade, tende a mitigar os efeitos nocivos no meio ambiente. Medidas compensatórias também podem ser tomadas, como projetos de reflorestamento. Por outro lado, além de estar gerando emprego em regiões pobres, a extração de lítio tem como principal vantagem o potencial que proporciona com relação à redução das emissões de gás carbônico, que podem vir a ser reduzidas com os carros elétricos.
A geóloga e mestranda em Geologia da UFRJ Júlia Mascarenhas aponta também o crescimento do interesse pelo estudo sobre o lítio no meio acadêmico como um fator positivo que pode levar a um aperfeiçoamento da exploração no Brasil. Segundo ela, especialistas nesse mineral ainda são na sua maioria mais jovens e com o tempo o conhecimento sobre o tema e sobre as condições dos depósitos brasileiros deve ser aprimorado.
De acordo com ela, outra vantagem do Brasil com relação aos outros países produtores da América do Sul é a utilização de métodos mais mecanizados, com emprego de mão de obra formal. O processo mais artesanal de outros lugares não garantiria a mesma proteção ao trabalhador. Recentes descobertas em minas que já foram prospectadas no passado para a busca de outros minerais também são apontadas como um fator relevante na redução dos impactos ambientais e para um maior aproveitamento econômico.
“O processo mecanizado tende a ser mais limpo do que o artesanal e costuma ser bem recebido pelas comunidades no entorno. A extração no Brasil tem se dado com baixos índices de acidentes com trabalhadores, o que é importante ser salientado. Por outro lado, a mineração pode estimular a geração de empregos e o crescimento econômico em regiões muito carentes de recursos, como o Vale do Jequitinhonha”, ressalta Júlia.
Com lítio de sobra no país, um setor que pode ser impulsionado é o da indústria. Recentemente, foi anunciado um investimento de R$ 25 bilhões para a implantação de uma fábrica da Bravo Motor Company no município de São Sebastião do Passé, na Bahia. A empresa vai produzir células de bateria de lítio para veículos elétricos e Sistemas de Armazenamento de Energia por Bateria (BESS) e deve começar a funcionar em dois anos, mas os investimentos previstos serão despendidos em nove anos.